Bebês reborn, Labubus e Bobbie Goods: o que objetos infantis dizem sobre os adultos de hoje


Tendência conhecida como “kidult” ganha força entre adultos brasileiros; 76% deles consomem brinquedos, segundo dados da ABRIN

Labubus são febre global com preços de até R$ 42 mil e altas vendas — Foto: Getty Images

Ursinhos de pelúcia nas bolsas, colares da Hello Kitty, cadernos Bobbie Goods, bonecas realistas tratadas como bebês. Esses são alguns dos sinais do fenômeno global “kidult” — junção de “kid” (criança) com “adult” (adulto) —, definição para quem consome e adota comportamentos associados ao universo infantil.

No Brasil, a tendência só avança. Segundo a ABRIN, Feira Brasileira de Brinquedos, 76% dos brasileiros entre 18 e 65 anos se considera consumidor do segmento, número acima da média global (67%). A febre se materializa nos Labubus, pelúcias colecionáveis que viralizaram no TikTok e provocaram tumultos no Reino Unido, onde chegaram a ter a venda física suspensa temporariamente após gerarem brigas e filas caóticas nas lojas. No mercado, o reflexo do boom: as ações da chinesa Pop Mart, sua fabricante, já subiram 200%.

Mas o que o apego a objetos da infância revela sobre o adulto contemporâneo? Para o psicanalista Alexandre Patrício de Almeida, doutor em Psicologia Clínica pela PUC-SP, essa “infantilização” é uma tentativa de buscar segurança emocional, em tempos de precarização da vida e de sobrecarga produtiva. “Quando o mundo adulto se torna insuportável, o mercado oferece soluções que parecem afetivas, mas são mercadorias de consolo”, afirma.

Aldeíde (Karine Teles) aparece com seu bebê reborn em cena de Vale Tudo, novela das nove da TV Globo — Foto: Reprodução/TV Globo

É o caso dos bebês reborn, bonecas hiper-realistas tratadas como filhos e que provocam reações e debates acalorados nas redes — e foi parar até na novela “Vale Tudo”, com a adoção de uma “bebê” pela personagem da atriz Karine Teles. Se, por um lado, funcionam como ferramentas terapêuticas em contextos específicos, por outro, ganham novos contornos na web.

Essa lógica, diz o professor e pesquisador Thiago Soares, doutor em Comunicação e Cultura Contemporâneas pela UFBA, é amplificada por estratégias de engajamento on-line. “Existe uma dimensão performática clara, que vincula a estética infantilizada ou jovial a curtidas, comentários e alcance nas plataformas.”

Diante de tantas polêmicas, quais os limites entre o bem-estar e o escapismo? “Não há problema em alguém colecionar bonecos se há suporte emocional. Mas, quando a substituição de vínculos humanos por objetos compromete a integração social, é preciso cuidado”, observa Claudio Paixão, doutor em Psicologia Social pela USP.

Julia Martins: ursinhos fofos para colorir e se desconectar — Foto: Reprodução

Em busca de equilíbrio, a estudante Júlia Martins, de 24 anos, encontrou nos caderninhos Bobbie Goods uma forma de se desconectar da internet e aliviar a ansiedade. “É um momento de calmaria na rotina, em que a única preocupação é escolher e combinar cores”, conta.

Na outra ponta, o fenômeno dos chaveirinhos fofos virou tema até de vídeo viral da empresária Fiorella Mattheis, da plataforma de second hand de luxo Gringa. Para ela, “marcas, criadores e designers estão apostando no lúdico como forma de vender sensação e acolhimento”.

Labubus — Foto: Getty Images

O boom dos Labubus, criados pelo artista chinês Kasing Lung, aconteceu no ano passado, quando Lisa, do grupo pop sul-coreano Blackpink, publicou uma foto com uma versão gigante do personagem. Os modelos regulares variam entre R$ 250 e R$ 400, enquanto edições limitadas podem ultrapassar R$ 2.500 — chegando a R$ 42 mil. Há, ainda, as falsificações, cujos valores partem de R$ 10.

Foi por esse caminho “mais acessível” que a servidora pública Nathalia Leite, de 32 anos, encontrou uma forma de alimentar sua paixão por miniaturas fofas. “Desde criança gosto de artigos colecionáveis, e quando conheci os Labubus, quis logo fazer uma coleção”, conta.

Ursinhos na bolsa: de todas as cores, para quebrar a seriedade — Foto: Reprodução

A estudante de jornalismo Geovanna Latsch, de 20 anos, também é adepta do estilo e pendura os acessórios em suas bolsas como forma de resgatar o lúdico. “Acho que eles quebram a sobriedade de ‘ser adulto’ na minha percepção. Não é porque nós crescemos que devemos parar de usar coisas fofas”, afirma.

Esse desejo foi percebido pela empresária Laila Cavalcanti, da loja de bolsas Isla, no VillageMall, na Barra. Desde 2024, ela acompanha de perto o impacto da tendência dos chaveiros fofos e lançou duas versões próprias: os ursinhos Teddy e Junior, que acompanham algumas bolsas da marca (a partir de R$ 2.199). “Já tive cliente que levou a bolsa só por causa do urso”, conta.  Como se diz por aí, é o hype.


Fonte: O Globo



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