A
economia brasileira bateu no fundo poço e registrou a menor taxa de crescimento
desde 1900 na última década encerrada em 2019. Entre os anos de 2010 e 2019, o
Produto Interno Bruto (PIB) do país cresceu apenas 1,39% ao ano.
O dado
consta de estudo do economista Roberto Macedo, da Universidade de São Paulo,
ex-secretário de Política Econômica e que foi presidente do Instituto de
Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). O levantamento considera que cada década se
inicia nos anos terminados em zero e vai até os anos que terminam em nove.
"A
década de 2010 foi a pior para o crescimento do PIB entre as 12
analisadas", afirma Macedo. O desempenho médio anual do período foi menos
da metade do registrado na década anterior, iniciada em 2000 (3,39%). Até
então, o pior resultado anual era de 1,75% nos anos 90 - época marcada por
crises externas e planos fracassados de estabilização.
A
crise fiscal, segundo Macedo, foi o principal fator que levou o País à
recessão, que começou no segundo trimestre de 2014 e terminou no quarto
trimestre de 2016. Desde então, a recuperação tem sido a passos lentos, com
avanços do PIB que não saem da casa de 1%.
O
fraco desempenho da economia brasileira nos anos 2010 - bem abaixo do
crescimento médio do PIB de 155 economias emergentes e em desenvolvimento, que
avançaram 5,11% ao ano no mesmo período de acordo com o estudo - mostra sua
face mais cruel no número de desempregados e subempregados.
No
trimestre encerrado em novembro, a taxa de desocupação era de 11,2%, ou de 11,9
milhões de pessoas, segundo a mais recente Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicílios (Pnad) Contínua, do IBGE.
"O
aumento do número de moradores de rua é uma consequência esperada, com a
situação da economia se agravando e o desemprego altíssimo", observa
Macedo. Esse é o caso de Francisco Eduardo Lopes, de 28 anos, que veio do Ceará
e há dois anos vive nas ruas da capital paulista. Ele, que cursou até a 7.ª
série do ensino fundamental, prestava serviços de pedreiro e pintura e tirava
R$ 2 mil por mês com as reformas. Mas desde 2018 não consegue serviço e acabou
indo parar num albergue. "Existe preconceito contra quem vive em albergue
e é complicado se recolocar, por não ter um endereço fixo."
Michel
Lopes Kiill, 52 anos, ex-bancário que cursou faculdade de Comunicação e não
concluiu, enfrenta problema semelhante. Hoje, ele deve R$ 38 mil para bancos e
financeiras e vive num centro que acolhe moradores de rua. "Quando você
diz que mora em abrigo, dificilmente alguém te dá emprego." Em 2015, último
censo da Prefeitura apontou que eram 15,9 mil pessoas na rua.
Na
última quinta-feira, dia 9, Kiill e Lopes eram dois dos cerca de 50 moradores
em situação de rua em um café da manhã comunitário oferecido na Paróquia de São
Miguel Arcanjo, no bairro paulistano da Mooca, na zona leste. Há mais de 30
anos oferecendo a primeira refeição do dia para quem vive na rua, o padre Júlio
Lancellotti, vigário da paróquia e da pastoral de rua da Arquidiocese de São
Paulo, diz que a maior parte deles é jovem e busca trabalho.
Sem ascensão
"Essa
estagnação prejudicou muito as gerações recentes. Percebi que nas gerações
passadas havia muita ascensão social, ou seja, o status social dos filhos
superava o dos pais. Hoje, isso se inverteu, com os filhos tendo dificuldade de
até mesmo manter o status social dos pais", diz Macedo.
Para o
coordenador de Economia Aplicada do Ibre/FGV, Armando Castelar, a retomada de
investimentos do País ainda depende da criação de "um ambiente de negócios
favorável, no qual os empresários tenham confiança em colocar dinheiro no
País". "O problema maior é a insegurança jurídica, a estrutura
tributária muito custosa e incerta. Também a infraestrutura é ruim, do ponto de
vista do investidor privado", afirma.
Colega
de Castelar no Ibre/FGV, o economista Samuel Pessôa afirma que, após anos
marcados pelo intervencionismo do governo, o País "tomou o caminho
certo". "Hoje, estamos infinitamente melhor do que em 2014. Só que o
caminho certo é doloroso. Por isso, a lentidão para ganharmos velocidade no
crescimento", diz ele. "Estamos arrumando a casa sem destruir a
macroeconomia. Isso é muito saudável e dá mais solidez."
Fonte: O Estado de S. Paulo.