O Sistema de Seleção Unificada (Sisu),
reserva, neste semestre, mais de 140 vagas em instituições públicas de ensino
superior para estudantes trans. Essas vagas estão distribuídas em três
instituições de ensino: Universidade do Estado da Bahia (Uneb), com 84 vagas;
Fundação Universidade Federal do ABC com 40 vagas e Universidade federal do Sul
da Bahia (UFSB) com 18 vagas.
O levantamento foi feito pelo Quero
Bolsa, plataforma de bolsas e vagas para o ensino superior, com base
nos dados da plataforma. O Sisu está com inscrições abertas até domingo (26).
De acordo com o Ministério da Educação (MEC), mais de 1,5 milhão de candidatos
fizeram a inscrição no sistema que seleciona estudantes para vagas em
instituições públicas de ensino superior com base na nota no Exame Nacional do
Ensino Médio (Enem) 2019.
Ao todo, o Sisu oferece nesta edição 237.128
vagas em 128 instituições de todo o país. Cada instituição tem liberdade para
definir os critérios para o preenchimento das vagas. Por lei, todas as
universidades federais, institutos federais de educação, ciência e tecnologia e
centros federais de educação tecnológica oferecem pelo menos metade das vagas
para estudantes que cursaram o ensino médio em escolas públicas.
Além dessas vagas, há instituições
participantes do Sisu que disponibilizam ainda uma parte de suas vagas para
políticas afirmativas próprias. As vagas reservadas para pessoas trans estão
entre elas.
Em 2018, a Uneb, que nesta edição concentra a
maior parte das vagas ofertadas para pessoas trans, aprovou a reserva de vagas
para este segmento, além de reserva para quilombolas, ciganos, pessoas com
deficiência, pessoas com transtorno do espectro autista e pessoas com altas
habilidades. A primeira oferta foi feita em 2019.
“São segmentos sociais invisibilizados e
excluídos socialmente, para os quais as cotas cumprem papel importante na
perspectiva no reconhecimento do direito das pessoas no acesso ao ensino
superior público”, diz a pró-reitora de Ações Afirmativas da instituição,
professora Amélia Maraux.
Amélia complementa: “Travestis e transexuais
têm um histórico de exclusão que é visivelmente colocado tanto do ponto de
vista da violência sofrida no Brasil, quanto de um sistema de violência
institucional e transfobia que impede que esses estudantes concluam até mesmo o
processo de formação na educação básica. Ao incorporar travestis e transexuais
no sistema de cotas a universidade reconhece esses sujeitos como sujeitos de
direito à educação superior”.
No ano passado, a Uneb teve 34 vagas voltadas
a pessoas trans. A expectativa é que, nesse ano, no ingresso dessas pessoas
aumente.
A UFSB também aprovou as cotas para pessoas
trans, para indígenas aldeados, quilombolas, e pessoas de origem cigana em
2018. “A nossa região é uma região onde o rendimento acadêmico é prejudicada
pela qualidade do ensino [básico]. A universidade, com um sistema de cotas
avançado como o nosso faz com que o estudante tenha mais facilidade de entrar
no ensino superior”, diz o pró-reitor de Sustentabilidade e Integração Social
da universidade, Sandro Ferreira.
Hoje, segundo ele, a instituição tem seis
estudantes trans matriculados. A intenção é ampliar esse número e incentivar,
de acordo com Ferreira, aqueles que deixaram a educação a voltarem a
estudar.
Ingressar na universidade, segundo a
jornalista da ONG TransRevolução, Maria Eduarda Campos, pode ajudar a gerar
mais oportunidades para as pessoas trans. “Cerca de 90% da população trans do
país está à margem do mercado de trabalho, sem enxergar perspectivas de ou
retornar ou ingressar nesse mercado. Acabam muitas vezes vendo a prostituição
compulsória como único caminho para conseguir ter uma renda financeira e se
sustentar”, diz.
A ONG é responsável pelo PreparaNem, projeto itinerante iniciado em
2015 para preparar pessoas transgêneras em situação de vulnerabilidade para a
prova do Enem.
Nome social
A adoção do uso do nome social no Enem fez
com que mais pessoas trans participassem do exame. O atendimento pelo nome
social é ofertado para participantes travestis ou transexuais que desejam ser
identificados, na aplicação da prova, em consonância com a identidade de
gênero.
O atendimento pelo nome social teve início no
Enem de 2014, quando 102 pessoas usaram o nome social durante a aplicação da
prova. Em 2019, esse número subiu para 394.
Esse tipo de atendimento fez com que Marie
Flora, 29 anos, fizesse a prova pela primeira vez, em 2016. “Fui super bem
tratada, meu nome social estava lá direitinho. Os responsáveis pela sala foram
super atenciosos comigo, já que eu tinha que preencher duas fichas diferentes.
Se eu não tivesse o acesso ao nome social na época, eu não teria feito o Enem,
é muito constrangedor ouvir um nome masculino no meio de uma sala inteira”,
diz.
Em 2017, a estudante teve o pedido do uso do
nome social negado. “Daí eu acabei não fazendo, exatamente por medo do
constrangimento. Uma pena, porque eu estava super empolgada com o Enem. Em
2018, mais uma vez eu me inscrevi e deu tudo certo”, conta.
No ano passado, a estudante já tinha o nome
retificado na identidade e não precisou solicitar o uso do nome social. Agora,
ela pretende concorrer a uma vaga de administração ou enfermagem. “Eu sei bem
que existe preconceito, sinto na pele sempre, todos os dias, por ser
"diferente". Mas continuo aqui na luta. Sonho com um dia em que as
pessoas nos tratem como seres humanos, nos respeitem”.
Sisu 2019
As inscrições para o Sisu podem ser feitas
pela internet. As inscrições, que
terminariam hoje (24), foram adiadas até o dia 26 devido a problemas na correção
do Enem.
Fonte:
Agencia Brasil