Os achados são uma má notícia tanto para os ambientes onde esses insetos vivem quanto para a agricultura, já que os diferentes tipos de abelhas selvagens desempenham papel-chave na polinização das plantações.
O
número de espécies de abelhas observadas na natureza mundo afora diminuiu cerca
de 25% entre 1990 e a década passada, indica um levantamento feito por
pesquisadores argentinos. Os achados são uma má notícia tanto para os ambientes
onde esses insetos vivem quanto para a agricultura, já que os diferentes tipos
de abelhas selvagens desempenham papel-chave na polinização das plantações.
Publicado
recentemente na revista científica One Earth, o trabalho é assinado por Eduardo
Zattara e Marcelo Aizen, da Universidade Nacional do Comahue, em Bariloche.
"Muitas
espécies de abelhas estão ficando com distribuição geográfica menor e/ou
perdendo tamanho populacional. Um número menor de outras espécies, em geral
associadas com as atividades humanas, está ampliando sua distribuição e
abundância. O efeito final é que, no conjunto, o planeta está perdendo
biodiversidade", resumiu Zattara em entrevista à reportagem.
O
pesquisador conta que o trabalho surgiu no âmbito de um projeto maior que conta
com especialistas de diversos países, entre eles brasileiros da USP. Para
conseguir uma amostragem global da diversidade de abelhas ao longo do tempo, a
dupla usou como base o banco de dados online do GBIF (sigla inglesa de Sistema
Global de Informação sobre Biodiversidade).
Esse
sistema recolhe tanto informações de museus de zoologia do mundo todo, que
remontam aos séculos 18 e 19, até fotos e outros registros de seres vivos
feitos com a ajuda de smartphones dotados de GPS por
"cientistas-cidadãos" nos últimos anos –ou seja, gente disposta a
contribuir para a base de dados mandando informações sobre os bichos que
encontra no seu cotidiano.
A
ferramenta é importante porque, embora já existam muitos indícios sobre o
declínio populacional de vários tipos de abelhas em outros estudos, os
trabalhos sobre o tema normalmente têm foco local ou regional, ou então abordam
apenas certos subgrupos de abelhas (uma linhagem que engloba cerca de 20 mil
espécies diferentes).
Os
dados do GBIF analisados por Zattara e Aisen apresentam duas tendências quase
opostas. De um lado, o número de registros de abelhas –as vezes em que a
presença de algum dos insetos é detectada por alguém– só aumenta ao longo do
tempo, e esse aumento se intensifica a partir dos anos 1990.
Por
outro lado, porém, o número de espécies nesses registros chega ao máximo nos
anos 1950, fica estacionado durante algumas décadas e desaba dos anos 1990 em
diante.
Em
tese, o fenômeno poderia ser explicado pelo aumento de registros feitos por
gente não especializada na base de dados –além de não conseguir reconhecer as
espécies naturalmente mais raras, as pessoas que contribuem para o GBIF de
maneira amadora tenderiam a recolher seus dados em ambientes urbanos, nos quais
a diversidade é naturalmente menor.
Só que
os dados do sistema sobre outros grupos importantes de insetos, as vespas e as
formigas, mostram tendências diferentes: um declínio mais suave no caso das
primeiras (que começa antes do que se vê entre as abelhas) e até um aumento no
caso das segundas. É um indício de que as informações do GBIF de fato estão
captando um fenômeno que afeta especificamente as produtoras de mel. E o
declínio está presente em todos os continentes analisados, incluindo a América
do Sul, embora o ritmo exato da queda tenha diferenças de uma ou duas décadas
de continente para continente.
E
quanto aos culpados? Zattara cita os suspeitos de sempre: perda de habitat, uso
desenfreado de agrotóxicos, a chegada de espécies invasoras e a mudança
climática. O pesquisador tem um exemplo bem no seu "quintal", aliás.
Ocorre
que, desde os anos 1980, agricultores chilenos passaram a importar a espécie
europeia Bombus terrestris para polinizar suas lavouras. A espécie nunca teve
importação autorizada para a Argentina, mas os bichos cruzaram os Andes e se
espalharam por toda a Patagônia argentina.
Quem
está pagando o pato é a chamada mangangá ou moscardão (Bombus dahlbomii), único
membro do grupo nativo da Patagônia argentina (trata-se de um parente das
mamangavas brasileiras). Sua população se reduziu drasticamente porque a
espécie europeia compete com ela por locais onde fazem os ninhos e por espaço
nas flores, além de trazer doenças contra as quais a espécie patagônica não tem
defesas.
E a
situação afeta também as plantas nativas, já que a abelha importada prefere
polinizar flores igualmente estrangeiras, deixando as espécies sul-americanas
na mão. Esse tipo de efeito-dominó deve estar se repetindo, com pequenas
variações, nos mais diferentes lugares do mundo, com consequências
imprevisíveis para a biodiversidade e a agricultura.
Com Informações Notícias ao Minuto