Dólar tem espaço para cair em 2022, mas não abaixo de R$ 5, dizem especialistas


O dólar teve um ano de valorização em relação ao real em 2021. Até o momento, a alta já foi de mais de 6%, passando de R$ 5,20 no começo do ano para a casa dos R$ 5,70 atualmente.

E especialistas ouvidos pelo CNN Brasil Business afirmam que, em 2022, a moeda norte-americana ainda deve se manter acima dos R$ 5. Segundo eles, há um certo espaço de queda, em especial com o ciclo de alta de juros que deve continuar em 2022, mas fatores internos e externos limitam esse efeito

Internamente, o principal fator a se considerar é o ano eleitoral, com uma disputa polarizada. Já no exterior, qualquer mudança na política monetária dos Estados Unidos, em especial nos juros, deve impactar negativamente o real ante o dólar.

Desempenho em 2021

Ricardo Teixeira, coordenador do MBA em Gestão Financeira da FGV, afirma que a cotação de uma moeda sempre é baseada em uma “realidade e em uma expectativa”. Em geral, quando as duas convergem, há uma estabilidade nas variações.

Esse não tem sido o caso do real em relação ao dólar nos últimos anos. Apesar de fatores internos contribuírem para isso, o maior peso ainda é da pandemia e suas consequências.

“Em 2020 e em 2021 nós tivemos no mundo uma situação atípica pela pandemia. Não sabíamos como as economias iam reagir, o que teria de oferta regular e oferta afetada. Por conta disso, as oscilações foram ocorrendo”, afirma Teixeira.

Segundo ele, o cenário foi se tornando mais previsível com o tempo, e a situação hoje está mais próxima de uma estabilidade. Entretanto, qualquer novidade ligada ao tema, como o surgimento de uma nova variante, reativa temores e favorece o dólar, moeda tradicionalmente usada como proteção por investidores.

Mas o dólar não chegou a US$ 5,70 recentemente apenas por fatores externos. Para André Perfeito, economista-chefe da Necton, o Brasil “exporta duas coisas, commodities e taxa de juros”.

“Os anos de 2021 e 2020 tiveram o que eu chamo de menor Selic que nunca existiu. O nível muito baixo cobra um certo efeito no câmbio, e isso bateu de forma a desvalorizar o real. Mas o Brasil tem bons fundamentos externos, a balança comercial é positiva e as reservas estão em níveis confortáveis”, diz.

Ele afirma que a desvalorização acabou sendo um resultado dessa “taxa de juros experimental”. Ao mesmo tempo, por mais que o Banco Central consiga elevá-la, ainda existem fatores que trazem risco e instabilidade, em especial incertezas políticas e fiscais e, portanto, os juros sozinhos não conseguem reduzir o dólar de volta ao patamar pré-pandemia.

Cenário interno em 2022

O cenário do Brasil deve ter dois grandes elementos que vão influenciar o comportamento do dólar em relação ao real em 2022.

De um lado está a taxa de juros, que passa por um dos mais intensos ciclos de alta em meio a uma inflação elevada. Em teoria, uma Selic alta atrai mais investimentos estrangeiros, já que o rendimento dos títulos do Tesouro é atrelado a ela, o que aumenta a entrada de dólar e valoriza o real.

Perfeito afirma que esse cenário traz uma perspectiva mais otimista para 2022. A expectativa de alta de exportação com commodities também favorece o câmbio, já que há mais entrada de dólar. A expectativa de queda da inflação é, ainda, um ponto positivo, segundo ele.

Já Teixeira diz que “quando eleva a taxa de juros, o que se tenta fazer é conter uma alta inflacionária” que estamos vendo acontecer. “A gente sabe que com uma elevação da Selic, dependendo do nível, pode ter uma vantagem da taxa de câmbio estabilizar ou reduzir um pouco pela entrada de capital estrangeiro”.

O mais provável, segundo ele, é que o ciclo aumente a estabilidade nas variações cambiais, mas não necessariamente leve a quedas relevantes. O câmbio, para ele, está em um patamar elevado, em que não se deve esperar novos solavancos de alta, a menos que surjam surpresas.

Entre essas surpresas, estão as eleições em 2022. Para o economista da Necton, o Brasil entra em 2022 com “renda real em queda, vagas com criação frágil, juros subindo e PIB fraco”. Esse ambiente faz com que, segundo Perfeito, “uma proposta liberal seja algo ruim de vender em 2022”.

Com isso, ele afirma que o favoritismo viria de candidaturas de oposição mais à esquerda, mas que, ao mesmo tempo, o mercado tem reduzido o medo em relação às chances da vitória de um campo político com propostas tradicionalmente mais afastadas do liberalismo econômico, o que pode evitar grandes variações de câmbio e investimento.

Outro fator de peso é a questão fiscal brasileira. Para ele, o que mais preocupa o mercado é a falta de um “plano claro” em relação a gastos e investimentos públicos. A ausência de plano gera incerteza, o que leva à retirada de investimentos nacionais e estrangeiros, e à elevação do dólar.

Ao mesmo tempo, reformas econômicas tidas como importantes para o mercado, como a tributária e a administrativa, não avançaram em 2021. A perspectiva é que isso não mude em um ano eleitoral, algo negativo para os investidores.

O professor avalia que pressões sobre o dólar são “normais” em anos eleitorais, mas que é necessário também que o Brasil tenha um plano para se beneficiar da retomada econômica global, que deve estimular a economia e investimentos, algo que favoreceria uma valorização do real.

“Nesse momento, a taxa de câmbio cairia se o fluxo de capital externo aumentasse. Com a pandemia, isso não ocorre em quase nenhum lugar do mundo. Não está em um nível de atividade econômica mundial que permite imaginar que ocorrerá um fortalecimento da economia brasileira”, afirma.

Ele diz que o Brasil pode se tornar uma economia atrativa para investidores, mas que isso depende de um mercado interno pujante e condições de produção, dois fatores afetados pela alta da inflação e dos juros.

Cenário externo em 2022

Pensando no ambiente externo, o grande fator ligado ao dólar é a política monetária dos Estados Unidos. Tradicionalmente, altas de juros no país atraem investidores estrangeiros por tornar os títulos do Tesouro – Treasuries – mais atrativos.

Isso implica, porém, na retirada de investimentos em outros mercados, como o Brasil, e a uma valorização do dólar ante essas moedas. A expectativa atual é que, com uma inflação em níveis recordes, o Federal Reserve aumente os juros já no segundo semestre de 2022.

“O banco central dos EUA vai subir os juros, já é esperado, mas deve fazer isso de forma segura. Não é algo rápido, porque sabe que se for rápido pode gerar uma crise financeira. Não acho que a política dos EUA está fora de controle”, afirma André Perfeito.

Teixeira diz que, em geral, uma pequena alta nos juros já mudam os fluxos de capital internacional, mas é que necessário que os bancos centrais trabalhem “para evitar que essa alta não seja prejudicial”.

O professor afirma que o quadro global ainda possui muitas incertezas, em especial devido à pandemia. Quando as primeiras notícias sobre a variante Ômicron surgiram, por exemplo, o dólar subiu. Esse quadro afeta as moedas de todos os países, não apenas do Brasil.

Com isso, há uma combinação das incertezas internacionais com a pandemia, as nacionais com as eleições e, ao mesmo tempo, os efeitos da alta de juros no Brasil e da possível alta nos Estados Unidos.

Esse conjunto, segundo Teixeira, faz com que “a curto prazo, a chance do dólar ficar abaixo de R$ 5 seja pequena”. Na mesma linha, Perfeito projeta a moeda entre R$ 5,30 e R$ 5,40 ao fim do ano que vem, acreditando que o maior fator que pesará na moeda é a alta de juros.

Em relatório publicado em dezembro, a XP Investimentos citou um quadro de depreciação cambial em países emergentes com as perspectivas de normalização mais rápida da política monetária dos Estados Unidos e as notícias sobre a variante Ômicron.

“É cedo, no entanto, para afirmar que esta será uma tendência para os próximos meses”, segundo o relatório. Os economistas da empresa afirmam que, com incertezas externas e domésticas no próximo ano, a projeção para o câmbio é de R$ 5,70 em 2022.

Já a Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima) projeta o dólar a R$ 5,60 ao fim de 2022, com os economistas da associação projetando um cenário mais desfavorável para países emergentes.

Fonte: CNN

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