Na Petrobras, presidente do Fla pode ter que decidir se manda processar a si mesmo

Bolsonaro e Rodolfo Landim | Foto de arquivo

Se de fato assumir a presidência do conselho de administração da Petrobras, como quer Jair Bolsonaro, Rodolfo Landim poderá ter que decidir se autoriza ou não a companhia a processar a própria gestora de recursos de que ele é sócio, a Mare Investimentos.

Isso porque, em outubro de 2020, o conselho da Petrobras determinou que o departamento jurídico da companhia apresente petições e protestos na Justiça contra "operadores financeiros" que tenham provocado prejuízo à carteira do fundo de pensão dos funcionários da petroleira, a Petros, com a finalidade de obter algum ressarcimento.

Entre esses "operadores" está a gestora de recursos de Landim.

A Petros acumulou nos últimos anos um rombo de R$ 33 bilhões com investimentos mal sucedidos devido à mudanças no cenário econômico, uso político, má gestão e corrupção na aplicação do dinheiro reservado para as aposentadorias dos funcionários.

Em 2017, a Petrobras concordou em injetar no fundo de pensão R$ 12,8 bilhões ao longo de 18 anos para cobrir o rombo. Os funcionários também pagam uma taxa extra para mitigar o prejuízo.

Entre os investimentos malogrados colecionados pela Petros está o Fundo de Investimentos e Participações Brasil Petróleo 1, ou FIP-BP1, que era gerido pela Mare, de Landim, e por outra gestora chamada Mantiq.

Ao todo, as duas firmas captaram R$ 585 milhões de oito fundos de pensão, incluindo a Petros, para aplicar em três empresas que ainda não existiam: uma companhia de tubos flexíveis, um terminal de reparos navais e uma operadora de navios de apoio para prestar serviços à Petrobras.

Nenhuma dessas empresas chegou a entrar em operação. Quase todo o dinheiro virou pó. Só a Petros perdeu R$ 92 milhões, segundo auto de infração da Previc, a autarquia do governo que fiscaliza os fundos de pensão.

Os diretores dos fundos, Landim e os outros sócios das gestoras de recursos são alvo de ações na Justiça que pedem a responsabilização por diversos crimes, entre eles gestão temerária e fraude financeira.

O processo contra os administradores dos fundos está em curso, mas o movido contra os sócios das gestoras de recursos foi paralisado no final de 2021 por uma liminar concedida pelo desembargador Ney Bello, do Tribunal Regional Federal de Brasília.

O desembargador acatou o argumento da defesa de que não houve crime no rombo do FIP-BP1. Consultado pela coluna, o advogado de Landim, Ricardo Pieri Nunes afirma que a ação contra ele é ilegal (leia íntegra da manifestação do advogado abaixo).

A liminar de Bello ainda tem que ser votada pelo tribunal, que vai decidir o mérito da questão. Enquanto isso, a ação fica em suspenso.

A reunião do conselho de administração da Petrobras ocorreu um ano antes da apresentação da denúncia contra Landim e mais cinco gestores do Brasil Petróleo 1. Àquela altura, diversos processos judiciais relativos a outros investimentos micados já estavam em andamento. Boa parte teve origem na operação Greenfield, que investigou irregularidades nos fundos de pensão.

A ata da reunião, de número 1642, mostra que o conselho decidiu orientar o jurídico a tentar atuar nos processos de modo a interromper a contagem do tempo para a prescrição de eventuais crimes e ter tempo para avaliar caso a caso se era possível "a busca de ressarcimento para os prejuízos causados à Petros", que a própria companhia teve que cobrir.

A maior parte dos conselheiros concluiu que processar apenas ex-diretores dos fundos, como a Petros vinha fazendo, não teria resultado, uma vez que essas pessoas físicas nunca terão patrimônio suficiente para ressarcir os prejuízos.

Só seria possível "cobrar o lucro então prometido à Petros quando da contratação de operações" processando as gestoras de recursos, ou "operadores financeiros".

Apenas o então presidente da companhia, Roberto Castelo Branco, foi voto vencido contra a determinação.

Segundo a transcrição da reunião, ele disse considerar que o mundo é "forward looking" (tradução da expressão em inglês olhar para frente) e que seria "necessário concentrar os recursos da Petrobras nos problemas à frente". O presidente do Conselho, Almirante Eduardo Bacellar Leal Ferreira, que será substituído por Landim, votou a favor.

Até hoje não há notícia de que a Petrobras tenha entrado com petições e protestos em ações relativas aos prejuízos na Petros.

A empresa, porém, já fez isso com alguns processos da Lava Jato que constataram e contabilizaram os desvios do petrolão. Pediu e foi aceita como assistente de acusação, o que permitiu obter o ressarcimento de valores bilionários.

Como a ação contra Landim é relativamente recente – e está suspensa, mas não anulada – há o risco de ainda entrar em pauta no conselho alguma medida judicial a ser tomada contra a empresa de Landim e seus sócios.

O que ainda não se sabe é como o preferido de Jair Bolsonaro lidaria com esse tipo de situação.

Também ainda não está claro o que vai fazer o comitê de conformidade da Petrobras, que checa o perfil dos indicados para conselho e diretoria, diante de um conflito de interesse tão explícito (a indicação será avaliada pela assembléia de acionistas no dia 13 de abril).

O que é evidente, para quem conhece o corpo diretivo da companhia, é o constrangimento que a indicação de Landim vem causando.

Leia a íntegra da nota enviada pela defesa de Rodolfo Landim: 

A ilegalidade manifesta da ação penal foi reconhecida pelo Desembargador Federal Ney Bello, do TRF da 1ª Região, que, em resposta à HC impetrado pela Defesa, entendeu que é "fácil perceber que nenhuma prática ilegal pode ser atribuída aos ora pacientes, enquanto gestores da sociedade empresarial denominada Mare Investimentos" e que "descabe falar na ocorrência de gestão temerária, tendo em vista que não restou demonstrada qualquer prática irregular que tenha implicado em risco ao Sistema Financeiro Nacional, conforme declarações da própria CVM”.

Fonte: O Globo


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