Novo grupo vai ser marcado pelo avanço da tecnologia, pressão climática e envelhecimento populacional
Os bebês nascidos a partir deste ano até 2039 farão parte de uma nova geração, a Beta, que chega na sequência da Alpha e terá a vida ainda mais fortemente impactada pelas tecnologias, como a inteligência artificial, e por experiências personalizadas. Cada geração é formada por um período de 15 anos, e mais do que a mudança cronológica, elas marcam transformações e impactos globais, por isso seus hábitos estão atrelados a um contexto histórico.
Até 2035, a Beta vai representar 16% da população mundial, segundo a consultoria McCrindle. Muitos viverão a transição para o século 22, tendo em vista que os bebês nascidos agora terão 76 anos em 2101, quando o novo século se inicia.

Geração Alpha é nativa digital; Beta vai crescer no mundo da inteligência artificial Foto: Seventyfour/Adobe Stock
Os Beta serão filhos dos Millennials (que têm idades entre 31 e 45 anos) e dos mais velhos da geração Z (16 a 30 anos) e vão carregar a mistura dos valores intergeracionais. “Os Millennials criam seus filhos com ideologia, ensinando valores, em contato com questões sociais. Eles entenderam que não salvarão o mundo, mas podem criar seres capazes de fazer isso”, diz a pesquisadora Marina Roale.
“A geração Z chegou mais cética, consciente dos problemas, mas com a sensação de ter herdado um mundo mais falido”, acrescenta ela, sócia do grupo Consumoteca, consultoria que realiza estudos de comportamento na América Latina.
Confira as perspectivas para esta geração em diferentes áreas:
Tecnologia
Para os Beta, a tecnologia estará intrínseca ao seu cotidiano e a inteligência artificial já não causará mais deslumbramento. Isso porque, quando chegarem à juventude, estas ferramentas já terão sido incorporadas aos lares, e elas serão utilizadas para construir relações.
“Eles serão capazes de criar vínculos com as máquinas. Haverá grandes debates sobre intimidade e vínculos, já que esta geração vai entender que, ao desabafar com máquinas que são oráculos de voz, é possível criar relações reais”, diz Marina. Ferramentas como realidade virtual e realidade aumentada, além de uma vida com muita automação, serão comuns para os Beta.
“Todos sabemos que é possível acender a luz por meio de um comando para a Alexa (assistente virtual), mas talvez isso não seja do cotidiano de todos. Para essa geração, vai ser”, afirma Marisabel Ribeiro, psicóloga e diretora de estratégia de talentos na Mercer, consultoria na área de gestão de pessoas e transformação digital.
A tecnologia por meio dos algoritmos de inteligência artificial vai atender a outra necessidade dos Beta: a possibilidade de personalizar experiências a partir das preferências e necessidades individuais em diferentes áreas, como educação, saúde ou entretenimento.
“Já percebemos algumas mudanças, mas para os nascidos nestes anos a personalização será fortíssima. Eles vão querer serviços e atendimentos específicos que levem em conta a genética e a diversidade que carregam”, explica Maiara Kososki, doutora em marketing e professora da PUCPR.
A geração Beta será a primeira a usar as telas com mais informações sobre os seus efeitos. Hoje ainda são estudados os impactos dessa tecnologia no desenvolvimento do cérebro, mas nos próximos anos essas consequências estarão mais claras, com a chegada das primeiras gerações nativas digitais à vida adulta.

Meio ambiente e preservação será uma preocupação que deve estar na pauta da próxima geração. Foto: Phoebe/Adobe Stock
Demografia e economia
A proporção de idosos quase duplicou entre 2000 a 2023, enquanto a taxa de fecundidade recuou de 2,32 para 1,57 por mulher no mesmo período. Com isso, a expectativa é de que os Beta tenham menos irmãos e primos. Estes fenômenos demográficos sugerem que a convivência com pais e avós e até bisavós poderá ser mais intensa, tendo em vista o aumento da expectativa de vida dos brasileiros.
“É possível vislumbrar impactos dessa experiência como, por exemplo, o aumento de senso de responsabilidade para os cuidados com gerações mais velhas”, diz Vanessa Cepellos, professora em Gestão de Pessoas da Escola de Administração de Empresas da FGV. Segundo ela, é possível também um amadurecimento precoce devido a responsabilidades que deverão ser menos distribuídas entre irmãos e outros parentes.
O envelhecimento da população também pode causar pressão econômica para que a nova geração tenha que buscar estabilidade financeira mais cedo. “O aumento na proporção de idosos na população pode desacelerar o crescimento econômico, levando a um desequilíbrio com relação aos gastos públicos (sobretudo em áreas como saúde, assistência social e previdência)”, diz Vanessa.
O fator é agravado pelo etarismo que indivíduos mais velhos ainda sofrem, o que dificulta a sua inserção e manutenção no mercado”, complementa.
As novas gerações também devem presenciar transformações no mundo do trabalho que já se manifestam hoje. A tendência é de que daqui para frente competências técnicas e socioemocionais sejam ainda mais valorizadas do que somente diplomas ou carreiras, segundo as especialistas.
Por isso, é possível que os Beta optem pelas trilhas de conhecimento, com cursos de curta duração, mas de forma contínua ao longo da vida, sem apostar em uma carreira única. “Começamos a observar que inovação e flexibilidade, e algumas outras características, serão indispensáveis. O profissional não saberá mais o que vai encontrar quando for ao mercado de trabalho. Essas habilidades serão mais valorizadas do que um conhecimento específico”, aposta Marisabel, da Mercer.
Influenciados pelos pais, os Beta devem crescer sem atribuir ao trabalho a única métrica para o seu sucesso. “Será mais uma parte de sua vida, e não o todo que responde por tudo. Eles serão estimulados a criar coisas e investir em hobbies”, afirma Marina, da Consumoteca.
Educação
Os Beta também devem pressionar os sistemas educacionais a se transformarem, com modelos de ensino, que priorizem o pensamento crítico, as produções autorais e a criatividade. “Com o nível de conectividade e acesso à informação que eles terão, será preciso mudar, por exemplo, o modelo de provas. No lugar de exigir respostas, cobre boas perguntas. A escola terá de explorar a possibilidade de fazer perguntas, uma conexão que só os humanos podem fazer”, acrescenta Marina.
Com o avanço da inteligência artificial, a produção e a construção do conhecimento passarão por metodologias ativas de ensino, que exigirão também mudanças na forma como preparamos os professores
Consciência ambiental
Nascidos em meio à crise climática, os Beta tendem a herdar uma atenção maior com o meio ambiente dos pais das gerações anteriores, influenciando hábitos e consumo, tendo em vista que o problema passou a ganhar espaço na vida cotidiana.
A ocorrência de eventos extremos - como ondas de calor, queimadas e inundações - será mais frequente, o que muda a percepção de urgência sobre o tema. Isso, no entanto, traz outros efeitos colaterais, como a ansiedade climática, diante da ameaça permanente de desastres naturais.
Dados sobre os adolescente de hoje, porém, ainda não mostram um salto na preocupação com o tema. Pesquisa da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre as mudanças climáticas mostrou que 38% das pessoas com mais de 60 anos pensam diariamente sobre as mudanças climáticas, enquanto o indicador para os entrevistados com menos de 18 anos foi de 27%.
Saúde mental
A geração hiperconectada e antenada aos vários temas que movem o mundo também deve sofrer com ansiedade e outros problemas da saúde mental. A vantagem é que, já entre os adultos Z e Millennials, esse campo ganhou mais valorizações do que entre as gerações anteriores.
“Diferentemente do passado em que se escondia quando uma criança fazia terapia, para esta geração a saúde mental será um investimento. Eles são filhos de pais traumatizados com essas questões. Hoje ouvimos muito sobre letramento emocional, mas é claro que só saberemos os resultados na prática”, explica Marina.
Ajudar os Beta a ter esse equilíbrio será um desafio. “Teremos de trabalhar com eles o balanço entre essa alta expectativa e a necessidade de estar antenado a tudo e a todos os estímulos que recebem, para que isso não os sobrecarregue. É ensiná-los a ser mais seletivos”, afirma Marisabel.
Para Lance B. Eliot, cientista e consultor em inteligência artificial, a tecnologia também será usada como fonte de soluções pra questões de saúde mental. “Ouso dizer que é provável que crianças que crescem com a IA em seus smartphones, óculos, colares e outros dispositivos vestíveis vão se tornar grandemente dependentes de conselhos sobre saúde mental fornecidos pela IA”, escreveu em artigo para o site da Forbes, em janeiro.
Quem é quem em cada geração*:
- Baby Boomers (1946-1964): nascem no contexto histórico posterior à Segunda Guerra Mundial (1939-1945) buscam por estabilidade no trabalho e vida pessoal, adotaram a tecnologia mais tarde.
- Geração X (1965-1979): vivem a consolidação da era digital, procuram por independência e mais equilíbrio entre trabalho e vida pessoal, aceitam o empreendedorismo como carreira.
- Geração Y ou Millennials (1980-1994): marcados pela expansão da internet e globalização, buscam por experiências com propósito e valorizam flexibilidade no trabalho.
- Geração Z (1995-2009): vivem o aumento do uso da tecnologia e o impacto das redes sociais, cresceram com acesso à internet e às mídias digitais, preferem trabalhar por projetos.
- Geração Alpha (2010-2024): marcada até agora pela pandemia, pelo uso de equipamentos tecnológicos e pelo modelo de trabalho e educação a distância.
Fonte: Estadão