Nastácia Schacht deu início à Charth em 2016, na cozinha de casa em Belo Horizonte (MG); marca tem cinco lojas físicas, mas comércio eletrônico ainda é responsável por 58% do faturamento
Marca de Nastácia Schacht tem clientes famosas como Eliana, Camila Queiroz e Andressa Suita
O que começou como uma marca de moletom na cozinha da advogada Nastácia Schacht, de 33 anos, se transformou em uma empresa que vende 100 mil peças ao ano - algumas com valores que chegam a R$ 21 mil.
Até 2016, Nastácia estava satisfeita com um emprego concursado no Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais (TCE-MG), mas, estimulada pelo marido, criou a Charth, para atender ao mercado de moda de alto padrão, em Belo Horizonte (MG).
Em dois meses, a marca recuperou o investimento de R$ 50 mil. Hoje, a Charth veste famosas como Camila Queiroz e Eliana e tem cinco lojas físicas, incluindo uma unidade no Shopping Cidade Jardim, em São Paulo (SP).
Primeiro contato com negócio foi em loja da família
Nastácia nasceu em Patos de Minas, no interior de Minas Gerais, e cresceu no mundo da moda e do empreendedorismo, porque a sua mãe tinha uma loja de roupas e sapatos na cidade. O primeiro emprego dela, aos 14 anos, foi no negócio da família, como vendedora.
Já na vida adulta, ela se formou em Direito e começou a trabalhar no TCE-MG, em 2015, depois de ser aprovada em um concurso público. Ela conta que estava feliz no emprego, mas sempre ouvia do marido, Diego Faria, de 35 anos, que deveria criar uma marca de roupas.

Nastácia Schacht, fundadora da Charth. Foto: Divulgação/Franklin Maimone/Charth
“Segui o conselho e abri a empresa. Criamos uma conta no Instagram e a despensa da cozinha virou o estoque”, afirma a empreendedora. O nome Charth foi inspirado na pronúncia do sobrenome de Nastácia.
A mineira ficou responsável pela parte criativa do negócio, enquanto Faria, que se tornou seu sócio, cuidava das etapas burocráticas. Eles investiram R$ 50 mil para dar vida à primeira coleção, que era focada em peças de moletom e tinha cerca de 10 modelos.
A produção, no início, era feita em um ateliê de costura terceirizado. “Elas cortavam, produziam e embalavam, já entregavam as peças finalizadas”, diz. Nastácia não tinha experiência com desenhos, então fazia setas com explicações para ajudar as costureiras a entender suas ideias.
Moletom de R$ 898 e parceria com Andressa Suita
A ideia da marca é atender aos desejos de um público disposto a pagar preços mais altos por produtos feitos com materiais de qualidade. A primeira peça a fazer sucesso foi um casaco de moletom, que tinha um olho grego bordado. O item está entre as peças da Charth que não saem de linha e, hoje, custa R$ 898.
Nastácia conta que recuperou o investimento de R$ 50 mil em dois meses. Ela diz que, nos primeiros anos, a marca cresceu de forma orgânica, já que tinha colaborações com influenciadoras, mas não investia em publicidades.
A primeira parceria da marca foi com a influenciadora Andressa Suita, que tem mais de 15 milhões de seguidores no Instagram e é casada com o cantor Gusttavo Lima.
“Logo no segundo mês da empresa, nós recebemos uma mensagem da Andressa, que tinha gostado de um produto da Charth. Nós mandamos de presente e o post dela trouxe muita visibilidade”, afirma. “Ela foi a primeira a nos procurar e abriu as portas para outras meninas fazerem o mesmo”.
No primeiro ano, Nastácia ainda se dividia entre a Charth e o TCE-MG, mas precisou escolher entre os dois em 2017. “Eu não dormia à noite e já não conseguia me dedicar 100% tanto para um quanto para o outro”, diz. Ela pediu exoneração e seguiu no empreendedorismo.
Na mesma época, Faria quis abrir um showroom da marca, já que a casa da mineira não comportava mais o tamanho da empresa. “Eu brinco que, se dependesse de mim, estaria na cozinha da minha casa até hoje, porque sempre fui muito conservadora. Mas ele sabia que era importante”, afirma. O espaço foi inaugurado em 2017, em Belo Horizonte.
Charth teve pico de crescimento na pandemia
Nastácia afirma que o ano mais importante na história da Charth foi 2020. Ela acredita que a marca conseguiu atingir o pico de crescimento na pandemia, porque não precisou fazer grandes alterações para entregar o que as pessoas buscavam naquele momento.
“Eu era a única vendedora da empresa na época e tinha disponibilidade quase 24 horas por dia para atender os clientes”, comenta.
“O nosso atendimento online era personalizado e especial para cada consumidor. Enquanto outras empresas precisavam se adaptar a isso, a gente já surfava nessa onda, porque era o nosso diferencial desde antes da pandemia.”
Ela atribui o sucesso da Charth ao “produto certo, na hora certa”. A mineira apostou na divulgação do moletom de olho grego, para atrair o público que queria estar confortável para os longos períodos de isolamento social, mas sem perder a sofisticação.
Para ajudar a vender a ideia de conforto associado a elegância, Nastácia contratou pela primeira vez influenciadoras. Destacar a qualidade dos produtos sempre foi parte da estratégia de marketing para justificar os valores cobrados.
“A gente já tinha, desde o início, segmentado qual público nós queríamos atingir. Sabíamos que a qualidade seria o diferencial para chegar lá”, aponta. “Nunca economizamos com matéria-prima barata, não só para as peças, mas também para embalagens, tags e todos os detalhes dos pedidos”.
Nastácia acredita que destacar essas características foi o que ajudou a conquistar a confiança dos clientes. Contudo, ela fala que o maior desafio de vender para o público de alto padrão é atender as altas expectativas, não só em relação aos produtos, mas em toda a experiência de compra.
A principal crítica que a marca recebeu nas avaliações no Google (veja mais abaixo) está relacionada a problemas no atendimento. “Eu brinco que a gente criou um monstro, porque o nível de expectativa dos nossos clientes é muito alto, por tudo o que já fizemos. Traz muita responsabilidade. Mas aceitar as críticas é a melhor forma de amadurecer”, afirma.
Peças chegam a custar R$ 21 mil
A estratégia de marketing que tem o maior investimento financeiro é o desfile próprio no lançamento das coleções, criado em 2022. A última edição aconteceu em abril deste ano e teve a atriz Camila Queiroz nas passarelas.
“É um investimento elevado. O maior retorno não é financeiro, mas sim o fato de a marca ser comentada e ficar na boca das pessoas”, diz a mineira.
As peças usadas no desfile são conceituais, com viés artístico e levam até quatro meses para serem finalizadas. Elas não ficam nas lojas, mas são disponibilizadas para clientes especiais.
Um vestido dourado, desfilado no ano passado, foi utilizado por famosas como a apresentadora Eliana - na gravação da vinheta de fim de ano da TV Globo - e as atrizes Jade Picon e Giovanna Ewbank. Avaliado em R$ 19.998, o item levou 60 dias para ser bordado a mão. No site, a peça mais cara é uma saia dourada, que custa R$ 20.998.
Incluindo todos os produtos, a empresa vendeu 127 mil peças em 2024. Desde 2019, os itens são produzidos em uma fábrica própria, na capital mineira.
Além de expandir o espaço do showroom de Belo Horizonte, a Charth abriu mais quatro lojas físicas - duas em Nova Lima (MG), uma em Curitiba (PR) e uma em São Paulo, esta última localizada no Shopping Cidade Jardim, na zona oeste da capital. Eles também vendem no atacado para cerca de 200 multimarcas do Brasil.
Apesar da força do comércio eletrônico, que é responsável por 58% das vendas no varejo, Nastácia acredita que as lojas físicas em pontos estratégicos ajudam a fortalecer a identidade da marca.
O faturamento da empresa não foi revelado.
Hoje, Natália ocupa o cargo de diretora criativa da Charth. Faria é o responsável pela expansão da marca e quer abrir mais lojas físicas ainda neste ano, mas com cautela.
“Crescer e inovar sem perder a essência é o nosso maior desafio. Queremos que mais clientes possam ter a chance de ir às lojas, mas sem perder o carinho a sem prejudicar a experiência”, conclui a empreendedora.
Avaliação de consumidores
A loja da Charth do Shopping Cidade Jardim, em São Paulo, recebeu uma classificação média de 4,3 estrelas no Google, com 23 avaliações até a publicação desta matéria.
Os comentários positivos elogiam a qualidade dos produtos e os negativos abordam problemas com o atendimento na loja.
Os autores das notas concedidas não podem ser verificados. Eventualmente, avaliações positivas ou negativas podem ser uma ação a favor ou contra a empresa.
No site Reclame Aqui, a marca tem 10 reclamações registradas nos últimos 12 meses, o que não é o suficiente para calcular a reputação, de acordo com as normas da plataforma.
Moda de alto padrão tem clientes fiéis, mas exigentes, diz especialista
A analista do Sebrae-MG Karina Hanun, especialista no setor de moda, diz que o desafio enfrentado pela Charth em relação ao nível de exigência dos clientes é comum aos negócios de alto padrão.
Ela explica que esse público é mais fiel às marcas de que gosta, mas exige uma experiência impecável, do tecido utilizado à forma como a peça é vendida.
“No final, o custo dos produtos é maior, já que é preciso ter primor no acabamento”, explica. Por outro lado, os preços praticados podem ser mais altos, o que ajuda a ter uma margem de lucro maior.
Um dos requisitos essenciais para quem quer investir no segmento é a paciência, porque as marcas de alto padrão precisam de mais tempo para se consolidarem. “É um negócio que deve ser pensado para o longo prazo. Para ter longevidade no luxo, precisa ter tempo para maturar”, diz Karina.
A concorrência com marcas tradicionais também é um desafio, já que os consumidores são fiéis às opções consagradas. O melhor caminho, diz a analista, é começar por pequenas coleções e dedicar tempo à elaboração e ao desenvolvimentos de cada um dos itens.
A entrega dos produtos - seja nas compras presenciais ou pela internet - precisa ser especial, com embalagens e detalhes que ajudem a diferenciar o negócio.
Mas como convencer o consumidor de que a empresa se encaixa na seleta lista de alto padrão? Para isso, é preciso comunicar os diferenciais. Karina aponta que as redes sociais estão entre as melhores vitrines.
“O empreendedor consegue segmentar os anúncios para o seu público-alvo, com ajuda dos algoritmos, que já entendem o comportamento desses clientes”, analisa. “Parcerias estratégicas com influenciadores ajudam, mas é preciso escolher perfis que comuniquem valores iguais aos da marca”.
Fonte: Estadão