O que separa a choradeira do charme culinário é, no fim das contas, uma combinação de ciência, prática e respeito pelo ingrediente

O que separa a choradeira do charme culinário é, no fim das contas, uma combinação de ciência, prática e respeito pelo ingrediente – weyo/Depositphotos
Na era das receitas em vídeos de 30 segundos e chefs amadores com seguidores aos milhares, um inimigo persiste firme e forte nas cozinhas domésticas: a cebola e sua capacidade infalível de arrancar lágrimas até dos mais durões. Mas por que, afinal, ela nos faz chorar – e por que isso não acontece nas cozinhas profissionais?
A resposta é menos mística do que parece e mais química do que você imagina. Ao ser cortada, a cebola libera enzimas que transformam compostos sulfurosos em gases voláteis. Esses gases, ao entrarem em contato com a umidade dos olhos, formam uma pequena quantidade de ácido – o suficiente para provocar ardência e uma enxurrada de lágrimas.
Cortando o problema pela raiz (literalmente)
Chefs experientes sabem que a chave para manter os olhos secos está em controlar essas reações desde o primeiro corte. Um dos truques mais eficazes começa antes mesmo da faca: resfriar a cebola. Seja com alguns minutos no congelador ou um banho em água gelada, o frio desacelera a ação das enzimas – e, portanto, o drama lacrimal.
Mas não basta gelar a cebola. A faca, nesse jogo, é protagonista. Uma lâmina afiada corta com precisão, rompendo menos células e liberando menos gás irritante. Facas cegas, por outro lado, funcionam como moedores improvisados: esmagam, espalham, fazem o caos.
Outro ponto pouco lembrado, mas fundamental: a raiz. Aquela extremidade que muitos descartam sem cerimônia é, na verdade, o ponto de equilíbrio da cebola. Manter o bulbo intacto durante o corte ajuda a preservar a estrutura das camadas e evita que a cebola se desfaça – facilitando cortes mais controlados e eficientes.

Técnicas que fazem diferença no prato e no olho
- Cubos perfeitos (brunoise): Com a cebola apoiada sobre uma base estável, faça cortes horizontais e verticais antes de fatiar. O resultado? Peças simétricas e cozimento uniforme.
- Tiras finas (julienne): Aqui o segredo é ritmo. Movimentos curtos e firmes, sempre no mesmo sentido, produzem fios delicados ideais para saladas e refogados.
- Meia-lua (para quem quer charme): Cortar contra as fibras e acompanhar o formato natural da cebola produz fatias elegantes e saborosas, com textura suave.
Sem lágrimas, com técnica
O que separa a choradeira do charme culinário é, no fim das contas, uma combinação de ciência, prática e respeito pelo ingrediente. Com cebola fria, faca bem cuidada e movimentos precisos, o que se vê no prato é só o melhor que esse humilde bulbo tem a oferecer.
E se ainda assim escorrer alguma lágrima, que seja de emoção diante do aroma irresistível saindo da frigideira. Porque, na cozinha, drama só se for no tempero.
Fonte: Catraca Livre