Nova pesquisa mostra que o declínio da saúde não é inevitável com o envelhecimento. Essa fase também pode ser uma oportunidade para ficar mais saudável e forte
Quando Florene Shuber tinha cerca de 82 anos, notou que às vezes tropeçava e caía. “Uma coisa que os idosos não percebem quando caem é que eles não sabem que estão em queda até estarem a mais ou menos isso de distância do chão”, diz ela, segurando os dedos a cerca de dois centímetros um do outro. “Achei bem assustador. Aconteceu duas ou três vezes. E pensei: tenho que fazer algo a respeito.”
Havia uma pequena academia perto de onde morava, pela qual passava havia anos, e finalmente entrou para pedir um encontro com um treinador. Ela começou a se exercitar regularmente.
Florene tem 91 anos agora e conta que se sente mais jovem e mais forte do que há dez anos. “Você pode melhorar. Eu vejo isso em mim, com certeza”, avalia. Mas acrescenta que é um trabalho difícil. “É preciso consistência.”

Florene visitando a primeira “casa das crianças” fundada por Maria Montessori, em 1907. Foto: Florene Shuber/The Washington Post
Algumas pessoas veem o envelhecimento como um declínio inevitável. Mas uma nova pesquisa publicada na revista PLOS One mostra que é possível, para muitos adultos acima dos 60 anos, recuperar força e bem-estar, mesmo depois de problemas de saúde.
“Nunca é tarde demais”, resume a primeira autora Mabel Ho, recém-doutora pela Universidade de Toronto.
O estudo começou a partir da pesquisa de Mabel sobre envelhecimento bem-sucedido no Canadá. Trabalhando com sua professora e coautora Esme Fuller-Thomson, ela analisou dados do Canadian Longitudinal Study on Aging para entender quais fatores contribuem para prosperar na velhice – definida como uma sensação autorrelatada de bem-estar físico, psicológico, emocional e social, independentemente de condições crônicas. Talvez sem surpresa, exercício e estilo de vida saudável foram essenciais.
Os dados vieram de um estudo de saúde e envelhecimento que acompanhou 51.338 canadenses por 20 anos para avaliar o que contribui para uma vida longa e saudável.
O que chamou a atenção dos pesquisadores foi um grupo de idosos – 8.332 pessoas – que relataram estar com a saúde ruim em uma ou mais áreas, mas que haviam revertido esse quadro três anos depois, quando os dados foram coletados novamente. Eles se concentraram em sua saúde e viram resultados.
“Notamos que algumas pessoas realmente melhoram com o tempo”, conta Mabel. “Foi assim que chegamos a essa descoberta muito encorajadora que chamamos de ‘recuperar o bem-estar’.”
O passo seguinte foi determinar quais fatores estão correlacionados à melhora. Os dados mostraram várias coisas que os idosos podem fazer, algumas surpreendentes para os pesquisadores.
O maior benefício? Cuidar da saúde mental
Ao observar de perto quem recuperava o bem-estar, os pesquisadores notaram que pessoas que relatavam ter boa saúde mental apresentavam quase cinco vezes mais chances de estar em ótimo estado de bem-estar três anos depois – aquele conjunto de sensação física, psicológica, social e emocional positiva. “Isso não era o que eu esperava”, observa Esme.
Acontece que, se você não estava deprimido no início, tinha muito mais probabilidade de encontrar motivação para fazer outras coisas importantes para melhorar a saúde.
A constatação reforça que idosos com dificuldades físicas talvez precisem, sempre que possível, cuidar primeiro das necessidades psicológicas e emocionais – especialmente se estiverem solitários.
“O isolamento social é realmente problemático para todos os desfechos”, informa Esme. Ela acrescenta que ter boa saúde mental e desenvolver conexões sociais sólidas exige esforço, mas não significa mudar de personalidade.
“Não quero que a mensagem seja que você precisa ser um extrovertido empolgado para envelhecer bem. Conexão social é o que você define como conexão. Então, se você tem um ou dois grandes amigos que são tudo o que precisa na vida, mas são maravilhosos, isso é realmente importante”, esclarece Esme.
Para Florene, viver em uma comunidade de aposentados ajudou a manter os vínculos, especialmente à medida que perdeu amigos e familiares com o passar dos anos. “Muita gente não quer ir para uma casa de repouso, e eu entendo”, diz. “Mas fica mais difícil quando você vive sozinho.” Ela conta que, para ela, planejar e viajar em grupo foi fundamental para manter conexões.
É possível ficar mais forte em qualquer idade
A maioria dos fatores que previam se uma pessoa idosa conseguiria recuperar o bem-estar ideal se resumiam a escolhas básicas de estilo de vida: não fumar (ou, se fuma, parar), alimentar-se bem e dormir o suficiente.
O exercício também foi essencial, como Florene descobriu quando começou a treinar com um profissional. A atividade física pode mudar a velocidade do envelhecimento, sendo tanto o treino aeróbico quanto o de força importantes. Nunca é tarde demais para começar, reforçam os pesquisadores, mas enfatizaram que os benefícios são ainda maiores se iniciados antes. Basta garantir que o exercício seja adequado ao nível de condicionamento, e consultar um médico se houver dúvidas.
“Acho que temos uma mensagem para pessoas de todas as idades”, avisa Mabel. “Nunca é cedo demais para adotar um estilo de vida ativo e saudável. Comer bem, se exercitar, dormir bem – isso é algo que todos podemos preparar para o nosso próprio envelhecimento.”
“Quero dizer, são todas aquelas coisas que sua mãe dizia”, comenta Esme.
Uma limitação reconhecida pelos pesquisadores é que, como o estudo foi feito no Canadá, todos os participantes tinham acesso a cuidados médicos gratuitos.
Segundo eles, o objetivo principal é mudar a narrativa sobre envelhecer: a velhice não é só declínio – pode ser também um período em que as pessoas ficam mais fortes e saudáveis, e os dados comprovam isso.
“Continue aprendendo de algum jeito”
Uma das coisas que muitos idosos em boa forma têm em comum é o desejo de continuar crescendo e aprendendo.
Há um programa na Universidade de Toronto que leva idosos de uma comunidade de aposentados para dentro de salas de aula universitárias. Florene participa e conta que tanto os mais jovens quanto os mais velhos se beneficiam da troca de perspectivas.
“A maioria das pessoas acha que o benefício vem dos jovens. Mas eu acho que nós, mais velhos, temos muito a ensinar a eles. Já passamos por tudo o que vocês experimentaram até agora e ainda vão experimentar”, reflete. “Como minha neta diria, os jovens às vezes se perdem nos detalhes.”
Marion Gommerman, 82 anos, também frequentou as aulas e depois decidiu se matricular na Universidade de Toronto, onde agora estuda ao lado do neto. A filha dela também é professora na universidade. O conselho de Marion para idosos que não têm a oportunidade de voltar à escola é encontrar uma forma de continuar aprendendo.

Marion Gommerman com o neto Sam Griffin e a filha Jen Gommerman Foto: Sasha Nagy/The Washington Post
“Continue aprendendo de algum jeito”, aconselha, seja lendo ou simplesmente se mantendo conectado à comunidade.
Florene sempre foi uma aprendiz por toda a vida. Depois de uma carreira como educadora, voltou à escola aos 40 anos para se tornar advogada. Teve uma segunda carreira exercendo advocacia e, depois, uma terceira, fundando uma faculdade Montessori para formar professores.
“Me aposentei aos 86 anos”, conta. “Acho que a grande surpresa de envelhecer é perceber que ainda há muitas coisas que considero emocionantes, áreas em que sinto que posso contribuir e ter uma vida plena.”
Fonte: Estadão


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