Relações entre Brasil e Estados Unidos enfrentam crise, agravada em julho após tarifaço. Encontro nos bastidores da Assembleia Geral da ONU em setembro marcou virada.
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Trump e Lula — Foto: AFP
A conversa por telefone entre Lula (PT) e Donald Trump na segunda-feira (6) marcou mais um episódio na aproximação ensaiada entre os presidentes do Brasil e dos Estados Unidos. A relação começou a mudar após um breve encontro que os dois tiveram na Organização das Nações Unidas (ONU), em Nova York, há duas semanas.
No dia 23 de setembro, Trump usou parte de seu discurso na Assembleia Geral da ONU para afirmar que teve “uma excelente química” com o presidente brasileiro. Na ocasião, ele anunciou que os dois iriam se reunir em breve.
Embora uma reunião presencial ainda não tenha sido acertada, as equipes diplomáticas de Brasil e EUA costuraram uma conversa telefônica, realizada na manhã de segunda-feira. Depois do diálogo, Trump usou uma rede social para dizer que teve uma “chamada telefônica muito boa” com Lula.
- O tom amigável contrasta com a crise na relação entre os dois países, que se intensificou após Trump anunciar tarifas de 50% sobre produtos brasileiros importados pelos EUA.
- Trump vinha criticando o Brasil, principalmente pelo que chama de “caça às bruxas” contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
- Lula, por sua vez, chegou a sugerir que o presidente americano queria ser o “imperador do mundo” e criticou o que classificou como “sanções arbitrárias” e “ataques à soberania”.
- Enquanto Trump dizia que Lula poderia ligar para ele "quando quisesse", o governo brasileiro relatou enfrentar dificuldades para conversar com os norte-americanos.
- A mudança na relação entre os dois começou na Assembleia Geral da ONU, após um breve encontro nos bastidores.
Veja abaixo ponto a ponto o que Trump e Lula já disseram.
Abril
Quando Trump anunciou tarifas de 10% em produtos de uma lista de países, incluindo o Brasil, Lula disse que o Brasil não abriria mão de sua soberania.
Lula: "Somos um país que não tolera ameaça à democracia, que não abre mão de sua soberania, que não bate continência para nenhuma outra bandeira que não seja a bandeira verde e amarela, que fala de igual para igual e que respeita todos os países — dos mais pobres aos mais ricos —, mas que exige reciprocidade no tratamento", afirmou o presidente.
➡️ O tarifaço anunciado por Trump incide sobre produtos estrangeiros importados pelos Estados Unidos. A medida, segundo a Casa Branca, visa responder a práticas comerciais consideradas injustas e proteger os interesses econômicos dos EUA.
Julho
Uma semana após o anúncio de tarifas de 50% para produtos brasileiros importados pelos EUA, Lula sugeriu que Trump queria ser o imperador do mundo.
Lula: "Não podemos deixar o Presidente Trump esquecer que ele foi eleito para governar os EUA. Ele não foi eleito para ser o imperador do mundo. Ninguém quer se separar dos EUA, ninguém quer ser livre dos EUA, o que queremos não é ser reféns dos EUA, queremos liberdade".
A porta-voz da Casa Branca, Karoline Leavitt, respondeu ao comentário de Lula.
Casa Branca: "O presidente (Trump) certamente não está tentando ser o imperador do mundo. Ele é um presidente forte dos Estados Unidos da América e também é o líder do mundo livre. E vimos uma grande mudança em todo o globo por causa da liderança firme deste presidente".
Depois, Lula falou que pediu conversa com autoridades americanas, mas que encontrou dificuldades.
Lula: "O que está nos impedindo é que ninguém quer conversar. Eu pedi para fazer contato. Eu designei meu vice-presidente, meu ministro da Agricultura, meu ministro da Economia, para que todos conversem com seus equivalentes nos EUA para entender qual é a possibilidade de conversa. Até agora, não foi possível".
➡️ Segundo o governo dos EUA, as tarifas de 50% para uma série de produtos brasileiros foram adotadas em resposta a ações do governo brasileiro que representariam uma “ameaça incomum e extraordinária à segurança nacional, à política externa e à economia dos EUA”.
🔎 Além das tarifas a produtos brasileiros, o governo de Donald Trump também revogou vistos de autoridades brasileiras, como ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Em outra frente, Trump incluiu o ministro Alexandre de Moraes, do STF, e a esposa, Viviane Barci de Moraes, na lista de sancionados pela Lei Magnitsky, utilizada para punir estrangeiros.
Agosto
Em agosto, Trump admitiu pela 1ª vez a possibilidade de conversar com Lula.
Donald Trump: "Ele (Lula) pode conversar comigo quando quiser. Vamos ver o que acontece. Mas eu amo o povo do Brasil. As pessoas que governam o Brasil fizeram a coisa errada".
Menos de uma semana após o início do tarifaço no Brasil, Lula deu entrevista à agência Reuters e falou sobre Trump.
Lula: “Pode ter certeza de uma coisa: o dia que a minha intuição me disser que o Trump está disposto a conversar, eu não terei dúvida de ligar para ele. Mas hoje a minha intuição diz que ele não quer conversar. E eu não vou me humilhar”, declarou.
Uma semana depois, o presidente brasileiro falou novamente sobre as relações com os EUA durante um evento.
Lula: "É mentira quando o presidente norte-americano diz que o Brasil é um mau parceiro comercial. O Brasil é bom, só não vai andar de joelho para o governo americano".
Setembro
No início de setembro, Trump comentou a relação com o Brasil.
Trump: "Bem, não sei… estamos falando de coisas que nos deixam muito desapontados com o Brasil. Aplicamos tarifas muito altas por causa do que eles estão fazendo, algo muito lamentável. Eu amo o povo do Brasil".
Já no dia 22, na Assembleia Geral da ONU, Lula abriu o discurso com uma crítica às políticas externas e tarifárias adotadas por Trump, sem citar o nome do presidente americano.
Lula: "Assistimos à consolidação de uma desordem internacional marcada por seguidas concessões à política do poder. Atentados à soberania, sanções arbitrárias e intervenções unilaterais estão se tornando a regra. Existe um evidente paralelo entre a crise do multilateralismo e o enfraquecimento da democracia".
Em seguida, Trump discursou e comentou um breve encontro com o presidente brasileiro.
Trump: "Eu estava entrando (no plenário da ONU), e o líder do Brasil estava saindo. Eu o vi, ele me viu, e nos abraçamos. Na verdade, concordamos que nos encontraríamos na semana que vem", disse Trump. "Não tivemos muito tempo para conversar, tipo uns 20 segundos (...). Mas ele pareceu um homem muito legal. Ele gostou de mim, e eu gostei dele. (...) Só faço negócios com pessoas que eu gosto. Quando não gosto deles, não gosto deles. Tivemos uma excelente química".
Outubro
Lula e Trump conversaram por telefone na segunda-feira. A ligação durou cerca de 30 minutos e tratou de assuntos econômicos, incluindo as tarifas aplicadas pelos EUA a produtos brasileiros.
Após o telefonema, Lula divulgou uma nota afirmando que os dois presidentes relembraram “a boa química” que tiveram no breve encontro em Nova York.
Lula: "Considero nosso contato direto como uma oportunidade para a restauração das relações amigáveis de 201 anos entre as duas maiores democracias do Ocidente", afirmou. "Nós concordamos em nos encontrar pessoalmente em breve. Sugeri a possibilidade de encontro na Cúpula da Asean, na Malásia; reiterei o convite a Trump para participar da COP30, em Belém; e também me dispus a viajar aos Estados Unidos."
Trump também comentou a ligação em uma rede social.
Trump: "Nesta manhã, eu fiz uma chamada telefônica muito boa com o presidente Lula, do Brasil. Nós discutimos muitas coisas, mas a conversa focou principalmente na economia e no comércio entre os dois países. Nós teremos novas discussões e nos reuniremos em um futuro não muito distante, tanto no Brasil quanto nos Estados Unidos. Eu gostei da ligação telefônica — nossos países irão muito bem juntos!"
Mais tarde, ao responder a perguntas de jornalistas, Trump disse que deve ir ao Brasil em breve. Ele também chamou Lula de “bom homem” e afirmou que os dois farão negócios muito em breve.
Trump: "Nós nos conhecemos, gostamos um do outro e, sim, tivemos uma ótima conversa. Vamos começar a fazer negócios. (...) Em algum momento eu vou [para o Brasil], e ele [Lula] vai vir aqui... Nós conversamos sobre isso."
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Infográfico - A química entre Lula e Trump. — Foto: Arte/g1
Fonte: G1

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