Embora o acesso à
educação seja um direito constitucional, crianças e adolescentes abandonam os
estudos ou nem mesmo chegam a ser matriculados em escolas todos os anos.
Na maioria das vezes,
trata-se de um contexto de exclusão escolar, pois os fatores determinantes são
o trabalho infantil, a pobreza e dificuldades de mobilidade, que impedem a
chegada até a instituição de ensino, e a discriminação que sofrem por terem
alguma deficiência, todos relacionados a um enredo de vulnerabilidade social.
A Pesquisa Nacional
por Amostra de Domicílios Contínua 2017, do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística, indicava que dois milhões de crianças e adolescentes com idade
entre 4 e 17 anos não frequentavam as aulas. Os maiores índices se concentravam
em grupos com as maiores faixas etários ou a menor delas, ou seja, quando
deveriam estar começando a ter contato com o ambiente escolar ou concluindo o
ensino médio. O levantamento mostra que 915.455 tinham 17 anos de idade e
298.948, 16 anos. As crianças de 4 anos de idade somavam 341.925 do total.
Para remover os
obstáculos, o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) tem mobilizado
uma rede de educadores e profissionais de outras áreas, como saúde e
assistência social.
Lançado em 2017, o
programa parte do princípio de que o oferecimento de serviços públicos por si
só não resolve problemas. A solução defendida são ações afirmativas, que
acertam em cheio os fatores que ocasionam as desigualdades sociais, conforme o
caso de cada pessoa beneficiada.
Portanto, põe-se de
lado a ideia de que há apenas uma única maneira ou ferramenta capaz de reduzir
as diferenças de acesso, já que cada criança ou adolescente tem uma história de
vida e, por isso, barreiras que são próprias de sua realidade cotidiana. A
busca ativa é feita de diversas formas, podendo abranger atividades
socioeducativas, mutirões, campanhas, palestras e visitas domiciliares.
O programa do Unicef
é dividido em quatro fases, que se inicia com o mapeamento de crianças e
adolescentes que estejam fora da escola ou que estejam sob risco de evasão
escolar e o reconhecimento dos motivos que geram essa condição, caso a caso. Na
sequência, as equipes estabelecem estratégias para assegurar que frequentem as
aulas. Segue-se a isso o acompanhamento: uma vez matriculadas ou rematriculadas
na escola, as crianças e os adolescentes participantes ficam sob observação das
equipes durante um ano para que sua permanência se firme e o risco de a evasão
ocorrer novamente seja afastado.
Como funciona
O prefeito municipal
é quem faz a adesão do município ao Busca Ativa Escolar. Até o momento, 3.050
prefeituras aderiram ao programa. A expectativa inicial era de que, ao fim de
2020, chegue a todas as 5.568 cidades brasileiras.
Além disso, 15
estados se comprometeram com a meta. São eles: Sergipe, Rio Grande do Norte,
Maranhão, Bahia, Ceará, Acre, Amazonas, Pará, Roraima, Rio de Janeiro, Espírito
Santo, Tocantins, Amapá, Goiás e Rio Grande do Sul. A região Norte está à
frente, com seis estados.
A celebração do
acordo com o Distrito Federal já está em negociação, segundo a oficial de
Educação do Unicef no Brasil, Julia Ribeiro. Em entrevista à Agência Brasil,
ela afirmou que o programa promove um regime de colaboração entre os entes
públicos. A articulação deve ser bem pensada porque os estados não fazem a
busca ativa, mas podem oferecer apoio técnico aos municípios, explicou.
"O que vemos
como um dos grandes ganhos é o engajamento de gestores para garantir o direito
à educação, o entendimento sobre a importância de dar visibilidade a crianças e
adolescentes que estão invisíveis para políticas públicas. Isso é um ganho
muito forte, porque é, inclusive, uma mudança de cultura que a nossa sociedade
precisa enfrentar", disse Julia.
A representante do
Unicef afirmou, ainda, que os casos em que jovens já frequentaram, um dia, a
escola e a deixaram não são extraordinários, e sim preponderantes. O motivo,
esclareceu, é o fato de que consideram que aprendem na sala de aula um conteúdo
desinteressante.
"Isso é um dado
fundamental para se pensar política pública", acrescentou Julia, que
defende o acolhimento das demandas dos estudantes e a adoção de currículos mais
condizentes com os seus interesses e projetos de vida.
Período noturno
Outra questão a se
enfrentar, na opinião da supervisora, é o cuidado com os alunos que estudam no
período noturno. Ela menciona que muitos pais temem que os filhos sejam
cooptados pelo tráfico de drogas. "Infelizmente, muitas vezes, o município
não tem escola disponível no turno diurno e a família não quer que [o jovem]
estude à noite. Então, muitos pais ficam travando o filho para ir",
pondera.
Dados específicos
sobre alunos que estudam à noite estão sistematizados de forma clara no
Observatório de Educação – Ensino Médio e Gestão, do Instituto Unibanco.
É tomado como
referência o Censo Escolar 2016, do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais Anísio Teixeira. Com a análise, nota-se, por exemplo, que a taxa
de abandono noturno na rede pública de ensino médio é maior na 1ª série desse
nível de ensino.
Em paralelo,
constata-se que outro elemento que contribui para aumentar as chances de os
alunos abandonarem os estudos é o perfil socioeconômico dos colegas. As escolas
que têm alunos com renda familiar de um a cinco salários mínimos têm falhado mais
em mantê-los.
Por acreditar que o
plano para a educação não deve desviar do de outras áreas, Eliane Pinheiros
confirma as impressões de Julia Ribeiro, no sentido de que o programa fornece
informações sobre como o poder público deve agir frente a um cenário complexo,
de inúmeros fatores. "É uma plataforma que, se seguir todas as
orientações, tem tudo para dar certo", enfatiza.
Curso
O Unicef oferece
instruções sobre o Busca Ativa Escolar, transmitidas através de um curso. A
capacitação é feita sem mediação de tutores e está disponível no site do
programa, no qual também estão reunidos materiais explicativos.
Fonte: Agência Brasil