O Instituto de
Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) divulgou hoje (22) o documento Brasil
Pós Covid-19, com um conjunto de propostas de curto e médio prazos para
acelerar o desenvolvimento sustentável do Brasil pós-pandemia, em uma
trajetória de crescimento e desenvolvimento.
O trabalho teve a
participação de pesquisadores de todas as áreas da instituição e as propostas
se dividem em quatro direções: atividade produtiva e reconstrução das cadeias
de produção, inserção internacional, investimento em infraestrutura, além de
proteção econômica e social de populações vulneráveis.
“O Ipea está
cumprindo o seu papel, que é o de oxigenar o debate e apresentar soluções. O
Ipea não executa nada. O papel é propor e responder às perguntas dos setores”,
disse o diretor de Estudos e Políticas Setoriais de Inovação e Infraestrutura
do Ipea, André Rauen, em entrevista à Agência Brasil.
Entre as sugestões na
área de infraestrutura, o Ipea propõe que o governo federal faça um programa
emergencial de manutenção de rodovias federais, especialmente nas que
passam por cidades que sofreram mais com o desemprego, um dos efeitos da
pandemia. Para André Rauen, essa é uma forma mais rápida de dar maiores
condições à população local. “A gente está usando a manutenção de
infraestrutura para gerar emprego e renda”, disse.
Ainda nessa área, o
documento propõe a criação de uma câmara para receber as diferentes demandas das
concessionárias do setor. De acordo com o pesquisador, o equilíbrio financeiro
dessas empresas foi afetado negativamente. “Elas já estão negociando com o
governo e o Ipea propõe a criação de uma porta de entrada única para
receber as demandas e dar um tratamento mais homogêneo a essas inúmeras
solicitações que já estão chegando.
"Acho que
precisa ter a participação de mais de um ministério, porque teve
impacto socioeconômico. A ideia é que seja realizado entre ministérios, mas a
operacionalização depende de como isso pode ser trabalhado no governo federal e
se os ministérios vão aceitar”, completou.
O saneamento também
faz parte das propostas. A intenção é aproveitar a aprovação do marco do setor
para criar um vigoroso programa focado em áreas irregulares. “Levar água e
esgoto para áreas irregulares, que são as comunidades de favelas, invasões,
porque esses grandes contingentes populacionais são aglomerados e têm um
potencial, como vimos agora na pandemia, de difundir doença se a gente não
leva saneamento básico”, afirmou.
Outra proposta é o
incentivo para a construção ferroviária privada no sistema de autorização.
Segundo Rauen, essa medida teria impacto imediato na geração de emprego e
renda. “Uma vez permitido, por exemplo, que grandes mineradoras e grandes
produtores de commodities possam construir suas próprias ferrovias,
eles iam partir para a contratação de pessoal de mão de obra mais básica, ou
seja, isso seria um impacto direto da concessão privada importante para este
momento”, lembrou.
O diretor do Ipea
informou que as propostas foram elaboradas considerando o cenário de restrição
fiscal do governo federal, mas acrescentou que uma das maneiras de conseguir o
dinheiro é rever políticas que não funcionam. “Na área social será
necessário dinheiro público, mas de maneira geral o que a gente quer é
conseguir recursos por meio da reorientação de políticas já existentes”,
observou.
Na área de transporte
público, o pesquisador disse considerar que a mobilidade urbana é um tema super
complexo, que não se consegue resolver da noite para o dia e exige debate
intenso com uma quantidade enorme de atores com diferentes interesses. “A saída
que a gente dá é o foco na redução desses problemas com um debate baseado nas
evidências, porque não é trivial, mas é um problema complexo, que tem inclusive
impactos sanitários, e um calcanhar de Aquiles por causa da aglomeração”,
disse.
No texto de
apresentação do documento, o presidente do Ipea, Carlos von Doellinger destacou
que em poucos meses, desde que começou a pandemia, o país passou de um cenário
razoavelmente promissor para o contexto atual, em que previsões indicam a
possibilidade de retração da economia em até 6%. “Evidentemente há grande
incerteza sobre a magnitude exata da queda da atividade econômica, mas não há
dúvida de que ela foi considerável”.
O setor mais atingido
foi o de serviços, que representa 70% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional.
Na sequência veio o setor industrial, principalmente a indústria de
transformação, mas em contraponto o setor agropecuário, por suas características
próprias, ainda conseguiu manter crescimento positivo, apesar de em nível menor
que as previsões do começo do ano.
Propostas
O presidente do Ipea
afirmou que a complexidade do contexto atual indica que o país está vivendo um
momento crítico e, por isso, propostas de políticas públicas e evidências
robustas e objetivas são insumos críticos para ações governamentais de curto,
médio e longo prazos. “Nossa intenção é prover subsídios para que o
governo possa planejar a recuperação da atividade econômica, com vistas à
melhoria das condições de emprego, de renda e das condições de vida das
populações mais vulneráveis, assim como oferecer possibilidades concretas de
proteção social e de políticas públicas de fomento setorial e regional, e úteis
à sobrevivência das empresas, em especial daquelas mais vulneráveis em razão do
porte e do setor de atuação”.
Na visão de Carlos
von Doellinger, embora haja projeção de queda de 6% no PIB em 2020, percentual
menor do que a média do mercado, a partir do segundo semestre do ano há
previsão de recuperação da economia, com alta entre 3,6% e 4,7% no período, o
que também está acima do mercado nos dois patamares. Para 2021, a expectativa é
de um crescimento de 3,6% do PIB, em função da baixa base de comparação do ano
anterior.
O diretor de Estudos
e Políticas Macroeconômicas do Ipea, José Ronaldo Souza Júnior, destacou que
diante do panorama atual dos impactos da pandemia na economia brasileira, o
equilíbrio fiscal é pré-requisito para transformar este cenário. “A gente tem hoje um
desequilíbrio fiscal e um déficit bastante elevado, mas precisa projetar para
os próximos anos porque esse ajuste vai acontecer. Só vai ser crível com base
em medidas concretas nessa direção, que precisam ser implementadas nos próximos
meses. Os gastos sociais são importantes neste momento, mas é preciso saber
quais estão sendo hoje efetivos e os que não estão".
O documento defende
que juntamente com as reformas fiscais necessárias, deveria ser executado um
amplo conjunto de reformas microeconômicas por investimentos e a reforma
tributária, que ajudaria a melhorar a eficiência da economia. “A reforma
tributária é uma questão que vem de muitos anos e quanto mais rápido ela for
aprovada, melhor. Isso apressaria nossa ida na direção de uma economia mais
eficiente e melhoraria a percepção sobre a economia brasileira”.
Empréstimo
O documento propõe
ainda a concessão de empréstimo favorecido, com pagamento vinculado ao
faturamento futuro, e uso estratégico das compras públicas, para fomentar a
atividade de micro e pequenas empresas. André Rauen disse que é preciso
reconhecer que essas empresas foram muito atingidas pela crise e precisam de
medidas urgentes. “Estamos propondo empréstimos para todas as microempresas,
que vão pagar no Imposto de Renda. Não tem juros, só o principal. Ou todas são
apoiadas, ou não há o efeito de tração na economia, e precisamos desse efeito
para a reativação. A gente garante que não vai ter inadimplência
porque vai pagar quando declarar o Imposto de Renda”.
Sobre as compras, o pesquisador
afirmou que o Poder Executivo deveria criar um espaço de market place gov,
como ocorrem com as empresas de vendas Amazon e Mercado Livre. “Todas as
repartições podem entrar e negociar com o cliente. Para compras de valor mais
baixo, tudo poderia ser feito pelo market place, para compras rotineiras
de fornecimento básico”, informou Rauen.
Setor externo
Na avaliação do Ipea,
o setor externo no Brasil foi, de certa forma, preservado das piores
consequências da crise, com crescimento significativo das exportações,
especialmente dos produtos do setor agropecuário. Houve forte concentração nos
mercados importadores da China. Mas as importações brasileiras sofreram
contração, o que beneficiou o saldo comercial.
O diretor de Estudos
e Políticas Macroeconômicas chamou a atenção para o fato de que os
investimentos diretos foram mantidos em nível razoável, considerando o ambiente
de crise que o mundo vive. “Diria que, de fato, o setor externo está em
situação bem melhor que os demais. Isso não quer dizer que deve relaxar”,
ressaltou.
Uma das propostas
nessa área é estimular o setor produtivo com atividades que fazem do comércio
exterior vetor de recuperação da economia. “Continuidade da agenda de
integração econômica com outros países, estímulo à produtividade e à
competitividade do Brasil, buscar parcerias internacionais para novos
investimentos, especialmente em infraestrutura e em novas plantas produtivas do
país”, completou.
Mercado de Trabalho
As propostas do Ipea
incluem ainda a criação de programas de subsídio temporário à contratação de
trabalhadores e renovação de programas de redução de jornada. Além disso,
sugerem a prorrogação dessa medida, implementada na Medida Provisória
936/2020, com reduções nas despesas do governo em benefícios emergenciais.
“A prorrogação tem um
prazo e um conjunto de ideias para aumentar a flexibilização do mercado de
trabalho e evitar demissões. Neste momento, algumas empresas estão com
insegurança muito grande de quantas horas e quantos trabalhadores elas
precisam. A ideia é manter o máximo possível o emprego, evitando demissões e
fazendo com que a retomada seja a mais rápida”, avaliou José Ronaldo Souza
Júnior, observando que ações e o auxílio emergencial do governo permitiram que
a perda de empregos fosse menor desde o início da pandemia.
Com Informações Agência Brasil
Clique aqui e receba nossos conteúdos diariamente.