Flamengo e Palmeiras farão o jogo da democracia em Brasília

Supercopa do Brasil oferece a oportunidade de substituir imagens da invasão aos prédios dos Três Poderes por outras, muito melhores, que só um jogo de futebol pode gerar

Estádio Mané Garrincha Paula Reis/Flamengo

É um grande acerto a escolha de Brasília como sede da Supercopa do Brasil, o duelo entre Palmeiras e Flamengo, marcada para o dia 28 de janeiro, no estádio Mané Garrincha. Depois de toda aquela selvageria ocorrida no último domingo, a capital federal merece ser palco do primeiro grande jogo do ano no futebol brasileiro. O campeão da Série A contra o campeão da Copa do Brasil, os dois times que ganharam os quatro últimos troféus da Copa Libertadores, os melhores jogadores em atividade no Brasil, o duelo de dois técnicos portugueses dignos de assumir a seleção brasileira.

Em campo, Flamengo e Palmeiras têm o suficiente para produzir mais um espetáculo histórico, como fizeram há dois anos, no mesmo Mané Garrincha, pela mesma Supercopa. Mas é por aspectos extracampo que esta partida ganha contornos transcendentais. Talvez qualquer outra sede fosse aceitável, afinal o Brasil tem mais de uma dezena de estádios de Copa do Mundo, e havia sobre a mesa propostas financeiramente interessantes aos dois clubes para levar o jogo ao exterior. Mas Brasília ganhou um peso simbólico que nenhum outro palco é capaz de dar.

A imagem da capital não pode ser a de um bolsonarista sujando a sede do Supremo Tribunal Federal ou vandalizando a Câmara dos Deputados, nem a de criminosos destruindo obras de arte, exemplares históricos da Constituição, artefatos raros e o mobiliário de prédios públicos. A Supercopa do Brasil oferece a oportunidade de substituir essas imagens por outras, muito melhores, que só um jogo de futebol pode gerar: a festa nas arquibancadas do Mané Garrincha; Everton Ribeiro ou Gustavo Gómez erguendo uma taça sob o céu de Brasília. Mais: diante da saudável condenação da CBF ao uso da camisa da seleção brasileira como uniforme do fascismo, o jogo se transforma numa oportunidade de celebrar a democracia – e de prestar as devidas homenagens aos grandes que se foram recentemente.

As preocupações com a segurança certamente se justificam, pelo histórico de violência em clássicos do futebol brasileiro e pela própria invasão de Brasília no domingo passado. Mas decisões judiciais certeiras removeram de postos importantes os facilitadores e incentivadores do golpismo, indignos dos cargos que ocupavam. Os que estão temporariamente no comando ganharam, com a Supercopa, a chance ideal para mostrar que o Distrito Federal consegue organizar com segurança um evento para 60 mil pessoas, com duas torcidas enormes chegando por terra e pelo ar de todas as partes do Brasil; para provar que Brasília não está disponível para ser aterrorizada por um exército de idiotas.

Farão bem se forem ao jogo tanto o presidente Luiz Inácio Lula da Silva quanto aqueles que pretendem lhe fazer oposição, para deixar claro que não se trata de um convescote partidário nem de uma celebração do governo de turno, mas de usar a atenção que o futebol naturalmente atrai para enviar a mensagem certa ao país que passou quatro anos submetido ao que há de pior. E que no domingo passado constatou – sem nenhuma surpresa para os que estávamos prestando atenção – onde o esgoto pode desembocar.

Fonte: O Globo

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