Vídeo mostra discussão entre sambista carioca, filho de Martinho da Vila, e suspeito de injúria racial


Suspeito disse ao g1 que não falou para Tunico da Vila voltar para favela. "Quero ver você fazer isso na favela", teria dito Milton. Caso aconteceu em Vitória na noite de sexta-feira (20).

Um vídeo mostra parte da discussão entre Tunico da Vila, sambista carioca filho de Martinho da Vila, com um vendedor de bebidas na sexta-feira (20), em Vitória. Tunico denunciou que foi vítima de injúria racial. Nas imagens, é possível ver Tunico sem camisa e de calça branca gritando com o homem, que responde. O homem diz para o sambista: "Ir fazer isso lá na favela". Tunico contou que antes do vídeo começar a ser gravado, o homem teria falado: 'volta pra favela, lá é seu lugar'.

O caso aconteceu na Rua da Lama, local conhecido por bares. A briga teria começado quando a esposa do músico passeava com o porco Soba, animal de estimação do casal e, ao ver o animal fuçando a grama, o ambulante reclamou com a mulher. A partir daí a confusão começou com a chegada de Tunico ao local.

O vídeo foi feito por uma moradora que mostra parte da discussão entre Tunico da Vila e Milton José Raimundo, de 59 anos. Nas imagens, os dois estão no meio da rua discutindo.

Versão do suspeito

Em entrevista ao g1 na manhã desta segunda-feira (23), Milton disse que trabalha há 25 anos como ambulante na capital e confirmou que era ele no vídeo, mas que em momento algum teria falado para Tunico voltar para a favela.

O ambulante disse que ficou incomodado com o fato do porco de Tunico, que estava passeando com a mulher, estar, segundo ele, destruindo a grama do local.

"Eu vi uma cidadã com um porco, passeando pela calçada. O porco passou e parou pra comer a grama, grama que tinha acabado de ser plantada. Eu chamei a senhora e falei que o negócio tinha acabado de ser plantado, nem inaugurou. O porco tinha acabado de fazer xixi e cocô. Ela não respondeu nada e eu disse que ia chamar a polícia", contou Milton.

Tunico da Vila discute com ambulante suspeito de injúria racial — Foto: Reprodução/Redes sociais

Depois disso, o vendedor relatou que foi até alguns policiais que estavam perto do local, mas que os militares disseram que não podiam fazer nada sobre o caso. Quando Milton voltou, ele encontrou Tunico já na rua.

"Fui lá falar com a PM sobre dano ao patrimônio, mas a polícia disse que não podia fazer nada, que não era com eles. Eu retornei, lá estava o filho do Martinho da Vila, eu nem sabia que ele era filho do Martinho da Vila. E ele falou: 'é você que tá atacando minha mulher? Todo exaltado. Aí eu falei: 'quero ver você fazer isso na favela, vai fazer isso que você tá fazendo aqui na favela, ver se você consegue sair de lá'. 'Volta pra favela eu tenho certeza que não falei isso. Não saiu outras palavras da minha boca que não fossem essas", relatou o ambulante.

O ambulante comentou que só ficou sabendo da repercussão do caso por outros conhecidos que comentaram com ele sobre o vídeo que estava circulando nas redes sociais. Milton afirmou que vai procurar a delegacia ainda nesta segunda para relatar a sua versão.

"Fui surpreendido por conhecidos meus falando sobre a notícia na internet, dizendo que eu tinha atacado ele. Eu não sabia nem quem era a pessoa. Eu ainda não fui chamado para prestar depoimento, mas eu mesmo vou até a delegacia. Até as fezes do porco eu guardei e vou levar comigo", disse o ambulante.

Versão do músico

No sábado (21), Tunico contou ao g1 que sua esposa, Débora Sathler Ferreira, estava passeando com o porco Soba, quando o homem começou a reclamar com ela.

Sem saber o que tinha acontecido, o sambista desceu até a rua da Lama, onde eles moram, para pedir que a esposa, retornasse para casa para ajudá-lo com o curativo porque estava sentindo dor em uma incisão feita recentemente. Tunico reforçou que o ambulante tinha sido grosso com a mulher e que é possível que o ambulante tenha recolhido as fezes do porco que ficaram no local.

"Ele foi gritar com minha esposa e falei pra ele falar direito com ela, e ele disse "volta pra favela que lá é o teu lugar. Aí comecei a chamar ele de racista, gritei e fui pra cima dele, não de agredi-lo, mas pra não deixar ir embora. Ele estava vendendo energético, não sei se tinha permissão. Depois de falar o que falou ,ele me chamou de macumbeiro", contou o sambista.

"Sou um sambista, ativista e lá no Morro dos Macacos, em Vila Isabel (RJ) aprendi que favela pra mim é um santuário e não existem apenas traficantes, a maioria das pessoas são benignas. São pretos e pretas que moram ali e vivem naquelas condições desumanas graças a um sistema da branquitude, não de pessoas brancas, mas aqueles arianos, escravocratas que não aceitam que pessoas pretas morem em um bairro como Jardim da Penha, por exemplo", disse Tunico.

Polícia

A Polícia Militar foi acionada e alguns estudantes e a advogada, que fez o vídeo do momento da discussão, também contaram o que tinham visto para os policiais. Milton disse ao g1 e para os policiais que se sentiu amedrontado.

O policial colheu os depoimentos e disse que não poderia prendê-lo porque se tratava de injúria e me orientou a procurar qualquer delegacia para registrar a denúncia. Me segurei muito porque realmente você fica nervoso e fiz o que achei correto, chamei a polícia", contou Tunico.

Segundo o advogado de Tunico, Hédio Silva, até quarta-feira (25), ele vai protocolar uma notícia crime por racismo.

"Vamos anexar as provas requerendo a instauração de inquérito por crime de racismo. Isso vai ser feito diretamente na delegacia de polícia e no Ministério Público. Uma advogada vai fazer isso presencialmente", comentou o advogado.

Tunico contou que não pretende falar sobre o episódio com o pai. Mas que a mãe viu o que aconteceu pelas redes sociais. O sambista desabafou nas redes sociais e também disse que está recebendo muitas mensagens de apoio.

"Não é gritar porque somos raivosos, é gritar pra isso dar um basta. Você espera, mas ao mesmo tempo você não espera aquilo. A vergonha não é minha, é dele. Eu tô muito chateado com a situação. Voltar pra favela é sim cunho racial. Preto não poder morar em um bairro bom, ele tem que morar na favela? Respeitem o povo das favelas, é uma coisa indigna de ser falado para qualquer preto ou preta. Chega disso. Não agridam, não partam para a violência, tentem filmar e chamem a polícia", comentou Tunico.



Fonte: G1




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