Políticas de Trump colocam mundo em ambiente de incerteza. O que esperar dos investimentos?


Tarifaço americano afeta decisão de consumo das famílias e investimento das companhias, levando a um crescimento econômico mais baixo

As políticas econômicas adotadas pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, colocaram o mundo em um ambiente de grande incerteza. Na economia real americana, os prejuízos de toda essa confusão devem ficar mais claros nos próximos meses, a depender do desenrolar das negociações dos EUA com os países e dos diferentes resultados de cada uma delas. Mas o que dá para dizer é que a insegurança entre consumidores e empresários cresceu com a guerra comercial, o que trava os investimentos das companhias e os gastos das famílias, afetando o crescimento econômico.

As decisões de Trump empurram o mundo para uma nova ordem global, e as incertezas que pairam hoje em relação ao que virá pela frente estão próximas de se equipararem às observadas na pandemia de covid, em 2020, quando a economia global enfrentou um duro choque.

Sem uma clareza de quais regras vão vigorar no comércio internacional, as companhias permanecem em compasso de espera. Elas não tiram projetos do papel por não saberem qual região global será a mais vantajosa para novos investimentos e se vão conseguir exportar.

“A gente não sabia quando a pandemia iria acabar, mas havia, desde o início, a expectativa da vacinação e, em algum momento, as cadeias produtivas iriam voltar”, diz Solange Srour, diretora de macroeconomia para o Brasil no UBS Global Wealth Management.

“Mas, agora, a perspectiva dos investidores é de que estamos entrando numa nova ordem global de verdade, que o mundo vai ser um mundo mais dividido”, acrescenta.

Em abril, o Fundo Monetário Internacional diminuiu a previsão de crescimento para a economia global de 3,3% para 2,8%. O FMI destacou as tarifas de Trump como fonte de “turbulência”.

No primeiro trimestre, o Produto Interno Bruto (PIB) dos Estados Unidos recuou 0,3%. Foi a primeira queda em três anos. O resultado foi influenciado pelo aumento das importações − com as empresas se antecipando ao tarifaço de Trump. Embora o resultado da economia tenha sido ruim, não há uma previsão, por ora, de que os EUA vão entrar numa recessão.

“A incerteza é grande e existe uma percepção de que a coisa mudou. Ela já vinha mudando antes. No primeiro mandato, o Trump já havia colocado tarifas sobre produtos chineses. O Biden não recuou nessas medidas”, afirma Armando Castelar, pesquisador associado do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV/Ibre).

“Obviamente, esperava-se uma coisa mais lenta. O Trump fez uma coisa mais radical e também foi uma medida que deixou de ser só com a China e envolveu todo mundo”, afirma.


Qual é o limite de Trump?

Neste segundo mandato do republicano, há uma grande frustração de parte dos agentes de mercado. Havia a expectativa de que, apesar das tarifas, o novo governo de Trump implementaria logo de início também medidas mais voltadas para o crescimento econômico − com uma agenda sempre defendida por ele de desregulação e corte de impostos.

“As tarifas, além de frustrarem, mostraram que essa é a grande aposta dele no primeiro ano do segundo mandato”, afirma Marcela Rocha, economista-chefe da Principal Asset Management. “Veio a surpresa com o anúncio das tarifas e a magnitude delas.”

Há também uma leitura de que Trump tem ido mais rápido do que o esperado, sobretudo ao considerar o caminho percorrido pelo republicano no seu primeiro governo. Em parte, o que explica essa velocidade é o fato de ele ter saído muito fortalecido das urnas, por vencer tanto no voto popular como no colégio eleitoral.

Em 2 de abril, no que chamou de Dia da Libertação, o presidente americano anunciou tarifas recíprocas de dois dígitos para 60 outros parceiros comerciais, num cálculo que ficou pouco claro. O Brasil recebeu uma tarifa de 10%.

“A gente não sabe o que o Trump vai fazer, mas a gente sabe que o limite do Trump é o título americano”, afirma Luis Otávio Leal, economista-chefe da G5 Partners.

As tarifas recíprocas foram suspensas em 9 de abril, quando os investidores passaram a vender títulos do governo americano, num claro sinal de que a economia dos Estados Unidos deixou de ser considerada − pelo menos naqueles dias − o porto seguro do mundo.

“Há uma sensação de que mudou, mas o Trump vai e, depois, volta. Está todo mundo na expectativa do que vai valer a médio prazo e o que esses acordos vão significar”, afirma Castelar. “A grande incerteza é se esses acordos vão valer ou não.”

EUA e China anunciaram uma trégua na guerra comercial Foto: Pedro Pardo / AFP

Na quinta-feira, 8, os Estados Unidos anunciaram um acordo tarifário com o Reino Unido. Na segunda-feira, 12, os EUA e a China anunciaram uma trégua para reduzir a maioria das tarifas recentes e estabelecer uma pausa de 90 dias em sua guerra comercial para permitir novas negociações.

Pelo acordo, os Estados Unidos vão reduzir a tarifa sobre as importações chinesas de 145% para 30%, enquanto a China diminuirá o imposto de importação sobre produtos americanos de 125% para 10%.


Novo patamar

Mesmo com uma eventual redução das tarifas, a leitura dos analistas é de que a economia global não vai voltar ao que era − o comércio internacional já mudou.

Por ora, é difícil chegar há uma conclusão definitiva de qual será o saldo final de toda essa incerteza para a economia brasileira. “A gente não sabe o que vai acontecer com commodities, não sabe o que vai acontecer com a inflação”, diz Alexandre Schwartsman, ex-diretor do Banco Central e economista da Pinnotti & Schwartsman Associados em entrevista concedida ao Estadão.

“Do lado positivo, tem uma questão de commodities e China. No caso de algumas commodities com as quais a gente compete com os Estados Unidos, notadamente a soja, pode resultar em um cenário positivo para o Brasil”, acrescenta.

Nesta terça-feira, 13, a ata do Banco Central indicou que a cúpula da autoridade monetária avaliou, no último encontro do Comitê de Política Monetária, que o Brasil parece menos afetado pelas novas tarifas comerciais dos Estados Unidos do que outros países. Mas, segundo ele, o País sente o impacto da medida em função do cenário global adverso - o Copom aumentou a taxa básica de juros em 0,50 ponto porcentual, para 14,75% ao ano, na semana passada.

“O cenário externo mostra-se adverso e particularmente incerto. O choque de tarifas e o choque de incerteza, apesar de todas as tentativas de mensuração, ainda são de impacto bastante incerto”, enfatizou o colegiado, acrescentando que as camadas de incerteza envolvem a própria determinação da política tarifária americana, a resposta tarifária dos demais países essa política e a reação das empresas políticas. Esse conjunto de fatores deve levar a possíveis impactos em cadeias globais de produção, e a resposta dos consumidores às mudanças de preços.

Fonte: Estadão



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