Crise levou milhões a abrirem os
próprios negócios
O
Brasil caminha, em 2020, para registrar o maior número de empreendedores de sua
história. Não exatamente por vocação, mas principalmente por necessidade. Nos
nove primeiros meses deste ano, o número de microempreendedores individuais
(MEIs) no país cresceu 14,8%, na comparação com o mesmo período do ano passado,
chegando a 10,9 milhões de registros.
Foram
1.151.041 novas formalizações entre o fim de fevereiro, pouco antes do
início da pandemia, até o fim de setembro, segundo dados do Portal do
Empreendedor, do governo federal. Somados às mais de 7,5 milhões de micro e
pequenas empresas, esse setor representa 99% dos negócios privados e 30% do
Produto Interno Bruto (PIB, soma dos bens e serviços produzidos) do país.
Impulsionados
pela crise gerada pela pandemia do novo coronavírus, os brasileiros estão
buscando na atividade empreendedora uma alternativa de renda. Com isso, uma
estimativa feita pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas
(Sebrae) mostra que aproximadamente 25% da população adulta estarão envolvidos,
até o fim do ano, na abertura de um novo negócio ou com uma empresa com até 3,5
anos de atividade.
"O
desemprego está levando as pessoas a se tornarem empreendedoras. Não por
vocação genuína, mas pela necessidade de sobrevivência", diz Carlos
Melles, diretor-presidente do Sebrae. Comemorado nesta segunda-feira (5),
o Dia da Micro e Pequena Empresa marca também um dos momentos mais desafiadores
para os pequenos negócios no país.
"Embora
seja um dia de celebração para os micro e pequenos negócios, vivemos um momento
muito difícil, onde a micro e pequena empresa está dentro de um redemoinho
causado pela pandemia. Estamos começando a ter que voltar a pagar os
impostos que foram suspensos por alguns meses, entre abril e setembro, e o
acesso a crédito ainda é um dos principais problemas", acrescenta Melles.
O
diretor-presidente do Sebrae vem defendendo que as medidas de estímulo aos
pequenos negócios sejam prorrogadas. Com o fim do prazo do adiamento do
pagamento de impostos, como o Simples Nacional, Melles vem trabalhando para que
o Congresso Nacional aprove medida que concede moratória aos tributos suspensos
entre os meses de abril e setembro. Ele não descarta, inclusive, a
necessidade de uma anistia aos empreendedores. "A gente tem a expectativa
de que o governo perceba que se não azeitar esse contingente que segura o
Brasil, vamos ver muitos negócios sendo encerrados".
Dados
do Ministério da Economia mostram que as empresas optantes do Simples Nacional
geram mais da metade dos empregos formais (cerca de 55% do estoque de empregos
formais) e participam de 44% da massa salarial.
Inovação
na crise
Apesar
do contexto adverso para os negócios em geral, pequenos empreendimentos estão
implementando inovação para enfrentar a crise. Levantamento feito pelo Sebrae
na última semana de agosto mostra que as vendas online continuam
em alta entre as micro e pequenas empresas que têm utilizado canais digitais,
como as redes sociais, aplicativos ou internet como plataformas para
comercialização de produtos e serviços. Enquanto no levantamento feito no
fim de maio, 59% das empresas utilizavam esses canais, atualmente esse
percentual chega a 67%. Entre os empresários ouvidos, 16% passaram a vender por
meio de ferramentas digitais a partir da chegada do novo coronavírus ao país.
A
microempresária Danyelle Mecenas Ferreira, dona de uma loja de moda feminina em
Porto Nacional (TO), conta que o início da pandemia provocou um susto grande.
"Eu parei nas primeiras semanas, mas logo depois, mesmo com a loja ainda
fechada, comecei a fazer delivery, e aproveitei para fazer cursos de formação
no Sebrae", conta.
Depois
de um treinamento em marketing digital e sua aplicação na rotina da
empresa, ela conseguiu dar a volta por cima. "Investi muito na internet,
na interação pelas redes sociais com cliente, fazendo live sobre
moda. Por incrível que pareça, fiquei melhor do que estava antes, consegui
vender mais", conta. Para dar conta do aumento da demanda, ela contratou
um novo funcionário, apenas para gerir as redes sociais da empresa.
Estímulo
Um
movimento de empresários, liderado por Abílio Diniz, Eduardo Mufarrej e Luciano
Huck, entre outros, criou, ainda em abril, uma entidade privada sem fins
lucrativos para arrecadar recursos e doações que estão sendo usados na forma de
crédito rápido e fácil, além de cursos de formação para estimular pequenos
negócios a se manterem durante a crise. Batizada de Estímulo 2020, a iniciativa
já concedeu 670 empréstimos, que totalizam cerca de R$ 23 milhões, com mais de
480 empreendedores contemplados.
Entre
eles está a empresária Renata Schver, sócia de uma agência de turismo na
capital paulista. A crise fez a empreendedora fechar o escritório e demitir
cinco funcionários. "Tinha uma reserva, mas não era suficiente para o
nível de despesa naquele momento. Minha irmã, que é minha sócia na agência, viu
um post no Instagram com a oferta do crédito e logo fomos
contempladas. Não exigiram garantia, que é sempre o principal empecilho para
obter empréstimos nas grandes instituições financeiras",
conta.
"Diante
da escalada da crise, com um monte de empresas fechando, o objetivo do projeto,
como primeiro pilar, era conceder crédito, para que as pessoas não fossem
à falência e conseguissem continuar girando as empresas. O segundo pilar era
educação, com a oferta de cursos por meio de parcerias. Assim, mesmo que a
gente não conseguisse atingir todo mundo com crédito, seria possível prover o
empreendedor com informações e conhecimentos sobre como gerir o negócio no meio
da pandemia", explica Fabio Lesbaupin, diretor de operações e tecnologia
do Estímulo 2020.
Para
viabilizar as operações de crédito, o Estímulo 2020 firmou parcerias com fintechs,
empresas de tecnologia financeira que, por meio de uma plataforma que cruza
informações sobre dados cadastrais e perfil de crédito das empresas, consegue
fazer uma rápida pré-aprovação do empréstimo. "O diferencial é que não
pedimos garantias, apenas um bom histórico de crédito anterior à
pandemia", afirma Lebauspin.
O
empresário Eufrásio de Sousa conheceu a Estímulo 2020 quando estava em um
período crítico de sua vida, com muitas dívidas e o negócio fechado. Há quatro
anos, ele é dono de um pequeno restaurante localizado perto da Avenida Nações
Unidas, em São Paulo. No estabelecimento, o cliente pode pedir um espeto junto
com três acompanhamentos, que podem ser arroz, feijão e batata ou outro prato
do cardápio. Com seis funcionários, ele conseguiu manter o negócio por causa do
empréstimo obtido.
"Estava
assistindo ao telejornal e tomei conhecimento da oportunidade. Já tinha tentado
no Santander e no BNDES, sem sucesso", relata. Três dias após fazer o
cadastro, ele recebeu um retorno positivo para o empréstimo, com juros de 0,53%
ao mês, três meses de carência e um total de 15 meses de prazo para quitação,
sem exigência de garantia. "Eu repus o estoque, paguei fornecedores,
mantive os funcionário e retomei a operação", celebra. O faturamento ainda
é apenas 50% do período anterior à pandemia, mas ele demonstra otimismo com o
futuro da economia do país.
Com Informações Agência Brasil