Pandemia: perda de renda e aumento de gastos obrigam famílias a reequilibrar o orçamento

Corte de despesas não essenciais, redução do consumo e busca por complemento de renda fazem parte do caminho para o equilíbrio financeiro.


"Quando eu me vi pagando as contas e ficando sem dinheiro para nada, percebi que era a hora de repensar as minhas prioridades", relata Paula Lettícia, professora particular e uma dos milhares de trabalhadores informais que foram diretamente afetados pela pandemia da Covid-19 no Ceará. Ela precisou reorganizar a sua rotina de consumo e elencar novas prioridades para manter as finanças saudáveis com a nova realidade.

"Eu tinha uma média de oito, nove alunos por mês e durante a pandemia fiquei apenas com dois, dando aula online, com um valor que corresponde a 25% do que era pago por uma aula presencial", explica a professora. De acordo com dados da Mobills, startup de gestão de finanças pessoais, no pico da pandemia no Estado, em meados do mês de abril, os gastos das pessoas com educação foram 20% menores do que em janeiro. Na pesquisa, foram analisadas as informações de 2.200 usuários cearenses.

Para Darla Lopes, especialista em finanças pessoais do Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças (Ibef/CE), a pandemia instigou o sentimento de reinvenção e isso também pode ser percebido na vida financeira. "As pessoas foram levadas a tomar consciência sobre a sua vida financeira. Quem não tinha uma reserva e passou por momentos de sofrimento, não quer viver isso de novo, quer se organizar para que, caso aconteça uma outra situação, isso não se repita", analisa.

Com o dinheiro insuficiente para arcar com o sustento, a fonte de renda na mira da crise e a incerteza de quando o cenário mudaria, aderir a um planejamento orçamentário familiar ainda é a medida mais prudente a ser adotada, explica Darla.

"É hora de estabelecer um plano mais acirrado ainda. O orçamento financeiro pessoal e familiar ainda é pouco utilizado. Não importa como ele é apresentado: manual, em um caderno, planilha, no computador ou em aplicativo no celular, o importante é a introdução do planejamento dos gastos e dos ganhos dentro da família", ressalta a especialista.

 

Construindo um plano

De acordo com Darla, é essencial que todos os envolvidos entendam que a equação (receita - despesa = resultado) tem que ser positiva. Isso significa que o consumidor tem que gastar menos do que ganha para manter o equilíbrio do orçamento.

Dentre as medidas que são fáceis de ser adotadas e podem fazer uma grande diferença no médio e longo prazos está o planejamento de gastos, identificando as prioridades para cortar eventuais gastos supérfluos. "Geralmente, pessoas com emprego informal acabam tendo mais dificuldade para se organizar, já que a receita é incerta e as despesas não", diz o economista Ricardo Coimbra, presidente do Conselho Regional de Economia do Ceará (Corecon-CE).

Nesses casos, Coimbra aconselha que o trabalhador informal busque calcular uma média de renda mensal para, aí sim, estimar quanto poderá gastar. "A partir daí fica mais fácil fazer um acompanhamento contínuo da receita e das despesas. Mas é importante que você consiga identificar os tipos de gastos, separando os que são fixos, como alimentação, educação, saúde e transporte, e controlar melhor os variáveis, como as despesas com lazer. Assim fica mais fácil identificar o que pode ser reduzido", observa.

Foi exatamente quando percebeu que a conta estava perto de ficar negativa que Paula decidiu colocar na ponta do lápis tudo que era gasto e onde poderia diminuir as despesas.

"Eu pedia muita comida em aplicativo de delivery, tomava café na padaria, almoçava fora, jantava fora, isso praticamente todo dia. Era muito raro comer em casa, até nos primeiros meses da pandemia. Mas, como meu trabalho é informal, eu fui ficando sem alunos e apertando o orçamento. Assim, comecei a ter um planejamento, escolher quanto e com o que gastar, prevendo o próximo mês", explica.

De acordo com dados colhidos pela plataforma Mobills, os registros dos usuários com lazer no Ceará tiveram uma queda de 50% em abril, no pico da pandemia no Estado, em comparação a janeiro. O dado reflete tanto o fechamento de atividades do setor como de redução de gastos.

 

Auxílio emergencial

Com a proposta de repor parte ou toda a renda de trabalhadores informais prejudicados pela pandemia, o auxílio emergencial pago pelo Governo Federal já teve redução de 50% do valor, passando de R$ 600 para R$ 300. E caso não haja outra paralisação das atividades econômicas por conta de uma possível segunda onda de Covid-19 no País, cenário com o qual a equipe econômica não trabalha, o benefício será encerrado até janeiro.

Na avaliação de Darla, as pessoas já deveriam estar se preparando para a realidade pós-auxílio, com uma nova configuração de receitas. "Nós já passamos por boa parte da crise, agora estamos saindo e tentando superá-la. As pessoas precisam estar preparadas e usar a criatividade para as oportunidades que serão demandadas pelo mercado e como elas podem usar essas oportunidades para retomar ou aumentar as receitas no orçamento pessoal", destaca .

Com a retomada da economia, o consumidor vive uma situação paradoxal: o estímulo do Governo ao consumo e a prudência do consumidor em controlar os gastos diante da incerteza. Por isso, as escolhas devem ser cada vez mais ponderadas e conscientes.

"O Governo está estimulando o consumo e nós, educadores financeiros, estamos instruindo que as pessoas controlem para que, no curto prazo, ele não se torne uma inadimplência", alerta.

 

Dívidas

Além de despesas desnecessárias, são as dívidas que acabam sendo os grandes vilões. Os problemas vão desde financiamentos de longo prazo até uso excessivo do crédito rotativo do cartão ou do cheque especial. "Como hoje estamos com taxas de juros baixas, há muitas pessoas que contraíram financiamento imobiliário há cinco anos que estão pagando juros mais altos do que os de mercado. Então é importante buscar alternativas, como encurtar o prazo de financiamento ou fazer a portabilidade para outra instituição com taxas mais baixas".

 

Adaptação

Quem passou por momentos difíceis durante a crise no Estado garante que não quer estar naquela situação novamente e que a mudança de hábito despertou inclusive aptidões até então desconhecidas.

"Comecei a cozinhar mais em casa e a criar uma rotina em torno disso: uma cozinha e a outra lava a louça. Agora, quando escolho comer fora, é uma saída mais consciente, para um lugar melhor, mas com menos frequência. Se tornou algo especial", diz Lettícia.

Para tentar manter as contas nos trilhos, a especialista aponta o caminho: "Lembrar sempre do objetivo maior. O que esse gasto está te fazendo abdicar agora?".

 

Com Informações Verdes Mares



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