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Entenda o que dizem estudos sobre a quantidade mínima de água para suprir suprir as suas necessidade fisiológicas — Foto: Marcos Santos/USP Imagens |
Você cresceu ouvindo isso: para atender as necessidades do seu corpo, é recomendado ingerir diariamente 2 litros de água. Essa é a orientação padrão nos sites de saúde por aí, e nutricionistas associados à Universidade e Califórnia acham até pouco: “recomenda-se que os homens bebam cerca de 3 litros de água por dia e as mulheres, pouco mais de 2 litros por dia”, dizem.
O Guia Alimentar para a População Brasileira, produzido pelo Ministério da Saúde, também argumenta que o valor pode passar de dois litros: “Como qualquer alimento, a quantidade de água que precisamos ingerir por dia é muito variável, e depende de vários fatores. Entre eles, estão a idade e o peso da pessoa, a atividade física que realiza e, ainda, o clima e a temperatura do ambiente onde vive. Para alguns, a ingestão de dois litros de água por dia pode ser suficiente; outros precisarão de três ou quatro litros ou mesmo mais, como no caso dos esportistas”.
Boa parte dessa crença vem de um estudo científico de 1972 chamado “Drawers of water: domestic water use in East Africa”. Ele apontava que, em climas tropicais, 2,6 L de água por dia são perdidos por meio da respiração, da transpiração insensível, da urina e das fezes. Se a pessoa realizasse trabalho intenso e/ou se a temperatura estivesse mais alta do que o comum, essa perda seria ainda maior.
Oras, se a gente perde 2,6 litros por dia no mínimo, então a recomendação de 2 litros parece até modesta, não? Temos é que beber mais?! Calma, não é bem assim.
Em sua edição mais recente, o relatório “Quantidade de água doméstica, nível de serviço e saúde”, da Organização Mundial de Saúde, que sempre citou o estudo de 1972 ao ponderar suas próprias recomendações de consumo, agora aponta que essa perda não é tão extrema. Segundo ele, novos estudos sugerem que “a perda total de água por respiração, urina, fezes e perdas insensíveis varia de 1,3 a 3,4 L/dia para adultos sedentários, aumentando para 1,9 a 8,6 L/dia para adultos fisicamente ativos”.
Vale lembrar que a água eliminada pelo corpo e a água consumida em determinado período (em inglês, essa relação é chamada de “water turnover”) não precisam ser iguais. Isso porque também absorvemos água do ar através da nossa pele e também a partir dos alimentos que ingerimos. A recomendação desse relatório da OMS é a ingestão de 1,6 litro por dia para pessoas com mais de 21 anos.
O que dizem estudos
Um estudo abrangente lançado em 2022 está mudando esse cenário. Ele se chama “Variation in human water turnover associated with environmental and lifestyle factors” e foi publicado na revista Science.
Mais de 90 pesquisadores, de diversos centros de pesquisa, em 23 países analisaram dados de 5.604 homens e mulheres com idades entre 8 e 96 anos. No estudo, é sugerida uma equação para determinar a renovação de água de cada pessoa. Essa equação leva em conta diversas variáveis: idade, sexo, peso, massa magra, altitude, umidade, temperatura do ar, nível de atividade física e índice de desenvolvimento humano (IDH) da região. Ou seja: há muitos fatores que podem mudar muito de uma pessoa para outra e até mesmo de um dia para o outro.
A pesquisa revela que a renovação de água é maior em ambientes quentes e úmidos e em altitudes elevadas, assim como entre atletas, mulheres grávidas e lactantes e indivíduos com altos níveis de atividade física. A maior renovação de água foi observada em homens entre 20 e 35 anos, que é o grupo com o maior gasto energético, cuja renovação de água média foi de 4,2 L/dia.
A partir daí, a renovação de água entre os participantes do estudo diminuiu com o aumento da idade, atingindo em média apenas 2,5 L/dia em homens na faixa dos 90 anos. Entre as mulheres, a renovação média de água entre 20 e 40 anos foi de 3,3 L/dia e também caiu para cerca de 2,5 L/dia aos 90 anos.
Ou seja: há muitos fatores envolvidos na quantidade de água que precisamos consumir e uma única pessoa pode (e vai) ter diferentes necessidades ao longo da vida. O texto crava: “este estudo claramente indica que uma medida não vale para todos no que diz respeito a diretrizes relacionadas ao consumo de água, e que a sugestão comum de que devemos beber cerca de 2 litros por dia não é respaldada por evidência científica”.
Quanto devemos beber então? O estudo tem o cuidado de não estabelecer um número geral — afinal, estaria se contradizendo. Mas a Agência Internacional de Energia Atômica, que abriga uma das cientistas autoras do artigo, afirma que “um número realista diário poderia ser tão baixo como 1,5 litros para homens jovens e 1,3 litros para mulheres jovens, variando com múltiplos fatores”. Já a Universidade de Roehampton, no Reino Unido, que participou do estudo, observa que “um homem típico nos EUA ou na Europa deve beber entre 1,5 e 1,8 litros por dia, enquanto as mulheres devem consumir de 1,3 a 1,4 litros”.
Moral da história? Os dois litros podem até ser um bom parâmetro. Mas mais importante ainda é entender se existem agravantes que podem ampliar a sua necessidade de água. Já se hidratou hoje, leitor?
Fonte: Galileu