O uso de estratégias digitais não é novidade no cenário
eleitoral brasileiro, mas ganha mais relevância pelo aumento de usuários da
internet e pelas limitações impostas pela pandemia
A comunicação digital
não é uma novidade no cenário eleitoral brasileiro. Contudo, a uma semana do
início da campanha, as estratégias nas plataformas virtuais devem ganhar mais
protagonismo nesta eleição. Além do crescimento do alcance da internet no País
e, por consequência, do número de usuários nas cidades brasileiras, a campanha
irá ocorrer com limitações ocasionadas pela pandemia de Covid-19. Na avaliação
de especialistas, diante disso, poderá fazer a diferença a busca por diferentes
formas de gerar mobilização.
Apesar de diversos
estados apresentarem uma tendência de queda dos casos de infecção pelo novo
coronavírus, eventos presenciais ainda terão que se adequar às normas
sanitárias, como o distanciamento social.
Com isto, a campanha
"corpo a corpo", historicamente importante em eleições municipais,
será impactada, e a presença digital dos candidatos deixa de ser uma
alternativa para o período de campanha e passa a ser essencial na interação com
o eleitor e nas estratégias para conquista de votos.
Segundo Marcelo
Vitorino, professor de Marketing Político da Escola Superior de Propaganda e
Marketing (ESPM), o protagonismo esperado, entretanto, também tem limitações.
"O papel do digital irá variar de acordo com o entendimento do candidato e
do marqueteiro. Se for um uso de tradicional, apenas como canal de replicação,
não terá tanta importância", analisa.
Para que o meio
digital possa fazer a diferença, considera ele, é preciso que haja uma estratégia
pensada para cada plataforma - tanto online como offline. "É o mesmo
eleitor em toda as mídias, mas quando ele está em cada uma delas, tem uma
expectativa de conteúdo diferente".
Estratégias
No meio digital,
aponta a professora de Teoria Política da Universidade Estadual do Ceará
(Uece), Monalisa Torres, o desafio será transformar o número de seguidores em
mobilização. "Uma coisa é conseguir engajamento. Agora, transformar isso
em mobilização política é que será o segredo. Transformar o seguidor em um cabo
eleitoral, que vai impulsionar (a campanha) na rua, na comunidade ou entre os
membros do WhatsApp".
O consultor político
Leurinbergue Lima concorda. "Nós precisamos ter multiplicadores",
afirma. Para isso, explica o especialista em Marketing Político, será
necessária uma "militância virtual engajada". "Em vez de as
pessoas segurarem bandeiras nas ruas, vão fazer isso nas redes sociais",
exemplifica.
Marcelo Vitorino
observa que alguns atores poderão atuar como "embaixadores" de
candidaturas. Segundo ele, é preciso identificar quem será a rede de apoio de
determinado candidato e "treinar e mobilizar essas pessoas".
"Quando precisa de público em uma 'live', mobiliza esses embaixadores para
levar as pessoas, por exemplo. Se você fizer ação combinada entre
impulsionamento e mobilização, é bem melhor até do que a campanha
tradicional".
Neste contexto, para
Leurinbergue Lima, a preocupação com a produção, embora importante, deve vir em
segundo plano. "Muitos candidatos se preocupam com a estética, mas
esquecem do posicionamento", argumenta. Conforme avalia, a prioridade deve
estar voltada a conteúdos que engajem o público que acompanha o candidato
virtualmente. "A gente vem de uma eleição de uma visão negativa da
política e do político. Com a pandemia, a possibilidade de abstenção é maior.
Então, o candidato precisa convencer o eleitor da importância de sair de casa
para ir votar", completa Monalisa Torres.
Segmentação
Apesar de existirem
inúmeras plataformas úteis para o desenvolvimento da campanha no meio digital,
as redes sociais devem ser centrais no desenvolvimento de qualquer estratégia
de comunicação dos candidatos. Dentre elas, estão o Instagram e Facebook, além
da ferramenta de troca de mensagens WhatsApp.
Os usos, no entanto,
variam. Segundo os especialistas, o Instagram, por exemplo, possui mais
usuários em grandes centros urbanos - como a Região Metropolitana de Fortaleza
- e concentra um público mais jovem, enquanto o Facebook costuma ser mais
utilizado nos municípios do interior e por eleitores mais velhos. Outras
plataformas, como o YouTube e o Twitter, possuem públicos mais específicos, mas
não são descartadas dentro das estratégias em discussão por profissionais.
Afinal, a segmentação
do público-alvo é uma das vantagens da campanha realizada no meio digital,
conforme explica a analista de redes sociais, Bárbara George. "No mundo
físico, o público é mais heterogêneo. Quando utilizamos as plataformas, é
possível filtrar o público em uma série de segmentos, como gênero, idade e
interesses", detalha.
Para aumentar o
alcance a públicos segmentados, entra em cena o impulsionamento das publicações
nas redes sociais. Candidatos ligados a pautas ambientais, cita George, podem
conseguir uma presença mais forte de suas publicações entre usuários cujo
perfis estejam alinhados com essas causas, por exemplo. O monitoramento do
resultado da propaganda, acrescenta ela, também é mais preciso.
"Nós conseguimos
saber quantos segundos a pessoa passou no vídeo", exemplifica. Dessa
maneira, as estratégias podem ser pensadas de maneira mais assertiva. "Não
é um tiro no escuro".
Interação
Além disso, as redes
sociais permitem maior interação com o público, o que pode ser uma alternativa
à diminuição do "corpo a corpo". "É uma eleição de mobilização,
então o candidato pode ligar, responder ao eleitor pelo WhatsApp. O contato que
ele tinha de forma presencial terá que ser feito de forma virtual", diz
Leurinbergue Lima.
Neste sentido, avalia
Marcelo Vitorino, alguns candidatos precisarão mudar a postura nas redes
sociais. "Ele publica algo, o eleitor comenta e ele não responde. Se, na
rua, ele responderia ao eleitor, porque na internet não?", questiona o
professor da ESPM. "É uma interação, é alguém que está apoiando",
pontua.
Desequilíbrio
De acordo com ele, a
linguagem utilizada pelos candidatos no meio digital também é importante para
uma aproximação com o eleitor. "Nas redes sociais, todos querem ver
pessoas parecidas (consigo)", argumenta. Fotografias publicadas com um
rodapé com o nome de determinado postulante ou mesmo com muitas alterações
feitas artificialmente, por exemplo, tendem a não funcionar bem em algumas
plataformas. "O eleitor cria uma antipatia natural".
Ferramentas
gratuitas, as redes sociais permitem, em teoria, uma igualdade entre os
candidatos. Contudo, os que têm uma presença digital há mais tempo podem ter
vantagens, analisa Bárbara George. "Os que já estão presentes vão ter mais
familiaridade. Políticos que chegam agora trazem vícios de formalidade e as
redes sociais são informais", ressalta. "É uma mudança de cultura
muito grande", concorda Marcelo Vitorino.
"O
desconhecimento é o que vai fazer com que fiquem em desvantagem", diz.
Para o professor, os candidatos precisam se apropriar da comunicação digital.
"A recomendação é que, antes de querer jogar, os candidatos conheçam as
regras e o campo. Não adianta querer fazer uma campanha como antigamente em um
cenário novo. Isso pode levar o candidato à derrota".
Com Informações Diário do Nordeste